O
BIQUINI
Juliano Polimeno
Nem mesmo o sol de verão poderia lhe propiciar a autorização para reduzir as dimensões de sua veste de praia. Talvez até mesmo do sol, queimando as faixas brancas do maiô de senhora casada, causasse ciúmes no marido inseguro. Digo maiô de senhora mas, na realidade, não se trata de uma dona de corpo que faça jus a tal peça antiqüíssima. Era sim uma bela morena com seus 31 anos, freqüentadora assídua das academias do Jardins, de corpo escultural (não tenham na cabeça as antigas representações das Vênus gordas e fatigadas), 3 plásticas no currículo, além de alguns mililitros de silicone nos seios. Posso dizer, no linguajar dos machos insensíveis, que era realmente uma “gostosa”.
Pois vejam, caros leitores, que tal mulher adjetivada possuía um marido. Sim, algumas delas costumam ter maridos. Ricos, de preferência. E que representam o papel de cão de guarda. Acredito até errar o verbo, não seria uma representação, mas uma sincera tormenta canina. Para terem uma idéia, era esse Totó quem comprava as roupas da madame, metros e metros de pano para encobrir-lhe os gastos com lipoaspiração, ginástica, silicone,
enfim... Gastavam para adquirir e esconder (fato corriqueiro em tal sociedade violenta onde casas suntuosas são encarceradas entre muros e cercas elétricas). Tem, mas não mostra. Ou não pode. Bem, voltemos.
A senhora em questão pôde certo dia comprar um desses biquínis pequenos, digamos um “microquíni”, e, sabendo que o marido não voltaria de viagem tão cedo, resolveu experimentar sua aquisição na casa de praia do casal em Maresias. Enfiou-se no carro às 7 horas da manhã e seguiu pela estrada, solitária com seu biquíni na mala. Lá chegando foi direto à praia. Se trocou dentro do carro mesmo, pois a ansiedade de aparecer com seu biquíni era já insuportável e madames de sociedade costumam não ter paciência.
Os pés na areia, óculos de sol, bronzeador importado, canga da Bahia de nenhum santo e lá se foi nossa heroína semi-despida.
Há de salientar que (pode parecer óbvio, mas terei que enfatizar) o desejo real travestido de biquíni, para além de
experimentá-lo, residia nos olhares alheios, nos assobios, nas expressões grosseiras e na ilusão de poder provocada pela negação positiva de tais elogios. “Não é comigo”, dizia cínica pra si mesma.
Mas creiam leitores, o sócio, espião de cotas doadas, reconhece nossa heroína por mais diferente (tsctc!) que ela pôde parecer aos olhos dele que a via sempre com quilos e quilos de roupas a esconder sua riqueza corpórea. Foi um espanto. Ele olhou, olhou de novo, mais uma vez e só então teve certeza. Era a própria esposa do poderoso. Quis por alguns instantes apenas observar aquela imagem, não suspeitava de tamanha saúde. Sentiu uma certa inveja. Pôde então se aproximar, depois de retomado o fôlego, e dizer-lhe:
- Pensava que teu marido era ciumento com dinheiro, mas vejo que o verdadeiro ouro ele soube esconder. Eu também cuidaria de encher-te de vestes, enganando os olhares duros. Veja esse biquíni! È uma belezura!
- Ah, Rafael! Você por aqui? Não é nada demais, é só uma bobagem que comprei para o verão, você gostou?
- Olha, sou amigo de teu marido, fiel a ele nos negócios, braço direito, amo aquele homem como a esposa que não tenho, poderia até mesmo morrer por ele que não me importaria, sou realmente apaixonado por ele, acho até que posso lhe confessar uma coisa extremamente intima já que o placar está a meu favor. Tive um caso rápido com teu marido gostosão.
- O que? Ah, cafajeste!
Ela, que trazia sua bolsa pendurada a tiracolo, puxou sua pistola de ouro, perfurou o sócio e recém descoberto amante do marido com dois tiros e sem perder a pose saiu pisando imponente com seu biquíni novo.
O biquíni até hoje continua no 43°DP como prova supérflua de um crime passional. E, aqui para nós, prova de que o título engana. Mas não falha.
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