PSICÓTICA
Juliana

No dia do meu julgamento, Edwiges estava lá. Eu tinha o cabelo comprido e o deixaram curto na prisão feminina. Ela me olhava com o mesmo desprezo que sempre senti por ela. O juíz pediu que eu contasse a história toda. Contei. Na época eu mal tinha 14 anos e seria julgada por homicídio como um adulto. Não me arrependo de.. bem, vamos começar do começo:

Eu tinha acabado de me mudar para El Rocio, no litoral da Espanha (sou natural de Londres, Inglaterra) pois meu pai queria abrir uma filial de sua loja na Espanha e achou que El Rocio era o lugar ideal. Minha irmã ficou com a matriz em Londres. Fui junto com papai, que era viúvo e entrei para o colégio público local. Fiz dois grandes amigos lá: Sarah, uma garota muito esquisita e Alex, o "cdf" da turma. Mas quem me chamou mesmo a atenção foi Zeus, o professor de literatura, um homem interessante e culto, que me deu mais lições do que eu gostaria de fazer, por eu ser inglesa ele teimou que eu precisava aprender espanhol rapidamente e para isso eu devia ler todos os livros da literartura espanhola que pudesse! Apesar disso, nos tornamos amigos. Também fiquei amiga da noiva dele, uma mulher alta, muito branca de cabelos "chanel" e pretos. Ia visitá-los sempre que podia e assim aprendi o espanhol em poucos meses.

Logo percebi que Zeus se apaixonava por mim. Quando jantava em sua casa ele dava um jeito de roçar sua perna na minha por debaixo da mesa. Uma vez tentou me beijar. Eu comecei a achar aquilo muito chato, o que a noiva de Zeus diria? O que eu não esperava é que ela já tivesse percebido as investidas dele. Ela veio me ameaçar! Disse com todas as letras: "Afaste-se de Zeus, inglesa maldita ou vai se arrepender, pois não hesitarei em matar alguém!".

Não consegui, porém me afastar de Zeus, de algum modo eu gostava dele e de suas insinuações, gostava de ser a menininha do professor... até que ela me ameaçou de novo: "Pára com isso menina!". Não parei. Ela me pegou em casa sozinha e me bateu: "Falei que você ia se arrepender!". Passei a ficar com raiva do professor mas ao mesmo tempo não podia deixar de vê-lo.

Aquilo estava me enlouquecendo. Até que um dia a noiva dele me ameaçou mostrando um bonito revólver prateado: "É o último aviso! Mais uma e alguém morrerá!". Fiquei com medo. Eu tinha acabado de fazer 14 anos. E se ela me matasse mesmo? Decidi dar um basta. Era eu ou Zeus. 

Sabia que naquela tarde ele estaria sozinho pois Edwiges, sua noiva, trabalharia no colégio à tarde (ela era professoa de matmática). Fui até o sobrado simpático em que ele morava e ele me recebeu com o mesmo sorriso de sempre. Fechei a porta e dei o meu primeiro e único beijo nele "É um beijo de despedida!". Ele não entendeu "Como?". Eu o esfaqueei 17 vezes e com a gritaria dentro do sobrado os vizinhos chamaram a polícia. Fui presa em flagrante, nem um pouco arrependida. Era ele ou eu. Edwiges sabia.

No meu julgamento ela estava lá. E ficou feliz ao saber que eu fui condenada a passar 11 anos num reformatório. Meu pai me deserdou, obviamente. Eu fiquei lá 11 anos e nunca me arrependi. No dia da minha saída sabe quem foi me buscar? Edwiges. Ela olhou para mim e disse: "Eu sempre quis saber se o ciúme seria capaz de matar" ri para ela e perguntei "Qual sua conclusão?" ela disse "O ciúme não mata ninguém. O que mata é o medo". Eu respondi "Discordo. Porque você não me paga um conhaque e discutimos o assunto?" ela sorriu para mim, coisa que nunca vi ela fazer: "Fechado" e me beijou na boca, o que me fez ficar confusa. "Meu ciúme era seu, garota boba, tive que esperar 11 anos para agradecer por você ter tirado ele do meu caminho". "Mas você me ameaçou várias vezes! Que palhaçada é essa?" respondi aflita. Ela gargalhou: "Eu nunca disse que ia matar você, disse?" pensei e respondi: "Não propriamente. Você dizia que ia matar alguém". Ela me beijou de novo, e disse "Eu ia matá-lo se você não o tivesse feito, garota mal criada!".

Era inacreditável! Ela amava a mim! A mim! Edwiges e eu estamos juntas até hoje, e rimos muito de Zeus, e agradecemos a sua morte, que nos fez encontrar o verdadeiro amor.

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