PARA BITUQUINHO
Shirley Kühne

Meu gato de olho azul
dizia sempre, tome cuidado
com gente.

Mas seu gosto pelo azul
amestrava qualquer noite livre
de estrelas.

O pêlo cintilava cinza-neblina
e arfava ronronando a vida
no peito das calçadas.

Circundava a minha chegada
com mil almofadas de cetim
pretas.

Mas meu gato de olho azul
está dentro de um saco,
morto.

Queria esquartejar todas as noites calmas,
e odiar seus corações ocultos em lençóis.
Amaldiçoar almas cúmplices do desprezo humano,
enfeitado por xaxins verdes de mentira em casas -
gaiolas de pássaros mudos.

Envenenaram meu gato de olho azul,
que agora fede num saco plástico
todo o cheiro ruim da humanidade.

Tentaram matar nossa parceria

Mas meu gato de olho azul
dentro do saco preto,
dentes arreganhados pela morte,
está rindo de todos, 
porque o que nos unia 
e une ainda
é muito mais que lindo. 
Virou saudade.

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