MAGIA
Ana Terra
Lembro da primeira vez que tive contato com a magia. Era muito pequena. Quatro anos, acho. Meu avô me acordou bem cedo e me convidou para sair. Era madrugada ainda. Eu nunca tinha visto neblina. Quando olhei aquele paredão branco, pensei que ele fosse intransponível. Fui colocada na bicicleta e assustada, vi que meu avô, com a maior facilidade do mundo, "furava" aquele paredão com rápidas pedaladas. Eu não acreditava no que estava vendo, mas naquele instante fui apresentada à magia da vida.
Mais adiante, consciente de sua existência, vi que era preciso saber conviver com ela. A vida real é cruel, na maioria das vezes. Se não fosse a magia, o ser humano não agüentaria passar por este mundo.
Quando adolescente, lembro da professora escrevendo poemas no quadro negro. Acompanhava palavra por palavra. Era mágico ver o "nascimento" da poesia. A sonoridade. A emoção. A musicalidade.
E fui aprendendo a caminhar com a realidade e magia. Vi que ela (magia) é a essência da liberdade, não admite rédeas e se instala quando você menos espera. Sua presença é sentida pelo estado de graça em que ficamos. Mas ela é rápida também. Permanece por segundos, horas ou alguns dias e vai embora. E não temos controle algum sobre isso.
Insistir que ela fique ou chamar por ela é um grave erro. Esta atitude pode se transformar em sentimentos menores, como ciúme, posse, egoísmo, que nos fecham e nos isolam.
Há períodos da vida que temos a impressão que ela desaparece. Culpa nossa. Ela está presente no dia a dia, no nascer e no por do sol. Basta querer ver. O sol se põe rápido demais. Se sua atenção for voltada para outra coisa no momento, quando voltar a olhar, ele já se foi.
Hoje continuo esperando e correndo atrás de momentos de magia. Para sentir o estado de graça que ela me proporciona não meço distância. Não penso nas dificuldades. E tenho tido sorte. Os momentos de graça alimentam a intuição e com isso a magia me visita com mais freqüência. Travas e amarras são destruídas. O riso, a gargalhada, o choro ficam em plena liberdade.
Estou aprendendo a viver um dia de cada vez, nunca esquecendo de dar espaço, nem que seja por alguns instantes, à magia.
Ao contrário do Pequeno Príncipe, não vejo o por do sol quando estou triste. Acho que meu planeta é maior que o dele e não posso simplesmente mudar a cadeira do lugar para assistir o grande espetáculo diário. Por isso me preparo para ver a morte de cada dia. E ela é linda. Uma nunca é igual à outra. Há milênios, a Natureza prepara este instante mágico com muito carinho, caprichando nas cores, na luz e na beleza. E esta "pintura" diária do céu me alimenta. Neste momento entendo que a vida é um eterno deixar fluir e ousar. Não escolher cores ou preocupar com estéticas. Apenas ser.
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