LUXO
Marina_W

Eu usava uma roupa inadequada, como sempre. Roupa de festa e ainda eram onze da manhã. Lembrei da mulher que vi em Nova York, com vestido de paetê, maquiagem quase desfeita, o cabelo em desalinho preso no alto da cabeça, passeando com um labrador, debaixo do sol forte. Era óbvio que tinha vindo direto de uma noitada. Não era o meu caso. Estava de banho tomado, os cabelos ainda escorrendo, tinha dormido bem e estava ao lado dele, dando voltas de carro pela cidade. Coloquei a blusa porque ela era feita de um tecido tão delicado que se ele encostasse nela seria como tocar diretamente meu corpo. Na hora me pareceu sexy, agora parece bastante idiota. Calor, buzinas, voltas pela cidade, apitos. A primeira coisa que ele me disse foi "Eu não gosto do Rio de Janeiro. Odeio, sabia?". Achei indelicado - eu não era carioca? Ele não me amava? Continuamos a rodar, engarrafamento, a mão dele na minha coxa (ou não?), a cidade infernal. Ele contava histórias de família, com tristeza e seriedade na voz. Eu tentava consolá-lo com palavras débeis. Falou sobre a mãe que havia sido internada, o irmão alcoólatra, a filha com possíveis sintomas de autismo. Desligou o celular para que não fôssemos incomodados. Calor. Rodávamos de carro, passando sempre pelos mesmos lugares, sem saber para onde ir, um lugar quieto onde pudéssemos nos beijar e esquecer quem éramos. 

Finalmente ele parou defronte a um prédio desalinhado, com janelas de esquadria de alumínio. Olhou pra mim. Teria coragem de subir? Endireitei-me no banco, pensei alguns segundos, fiz que sim. Um apartamento emprestado de um amigo, talvez. Subimos no elevador em silêncio, como estranhos. No apartamento de poucos móveis nos beijamos e tiramos algumas peças de roupa com rapidez. Eu estava tímida, ele suava. Ainda não sabíamos que estávamos enganados. E ele não falou de amor, esta palavra inventada.

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