PERDER O EMPREGO?
Maurício Cintrão

Perder o emprego é uma expressão infeliz. Dá a idéia de que o sujeito saiu para passear com o emprego e o esqueceu na praia ou em uma poltrona do aeroporto. Ninguém perde o emprego. As pessoas ficam desempregadas, pedem para sair ou, como acontece na maior parte dos casos, fazem o acordo do ponto pacífico: o patrão entra com o pé e o funcionário entra com o ponto pacífico. Você já levou um pé no ponto pacífico? Pois é, então sabe do que eu falo.

Há muitas outras formas de se referir a essas férias compulsórias sem usar a infeliz expressão "perdi o emprego". Por exemplo, você pode afirmar que foi para o DIEESE (para quem não sabe, Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Sócio-Econômicos, que mede a situação do mercado de trabalho no País). Os amigos vão perguntar espantados: "ué, virou estatístico?" Aí você responde: "não, engrossei as estatísticas".

Outra alternativa é dizer que você agora é da Ferrari. "Ahn?", vão perguntar os mesmos amigos (amigo é bom para fazer papel de bobo em piada de crônica). Aí você responde: "o emprego era meu, mas o chefe da equipe mandou que eu deixasse o segundo passar na frente". Essa é infame, mas funciona.

Tem mais, tem mais. Você pode dizer que foi auditado. Neste tempos de redução de quadros, o que as auditorias mais fazem (quando não ajudam empresas norte-americanas a trambicar balanço) é propor corte de pessoal para conter custos. Você já viu alguma empresa passar por auditoria externa sem cortar pessoal?

Pode, ainda, dizer que virou consultor. Ah, essa é ótima! Os amigos vão olhar para você com uma pontinha de inveja. Afinal, todo mundo sabe que consultor não faz nada. No fundo, você não estará mentindo. Desempregado, terá tempo de sobra. Só não ganhará uma fortuna para fazer isso.

A título de brincadeira você também pode sair com um "virei toalha". Sempre tem um amigo mais sonso que pergunta: "toalha? por que, heim?". Aí você completa a piadinha: "participei do enxugamento da empresa. Hohoho!" É ridícula, eu sei. Só deve ser usada naqueles casos em que todo mundo sabe que você dançou, mas ninguém tem coragem de falar nada.

Nessas situações constrangedoras em que todos olham para você com aquela cara de pena, avacalhe de vez. Ande de bumbum arrebitado e com as pernas meio abertas. Sempre aparece alguém que pergunta: "nossa, por que você está andando assim?". Aí você fatura: "fui modernizado pela empresa". Afinal, quando as empresas modernizam, quem leva no ponto pacífico são os funcionários.

Enfim, há muitas formas de tratar essa tragédia pessoal. Só não me venha com a história de que perdeu o emprego. O mercado de trabalho não é um congresso de amnésicos. Quando muito, diga que virou vaga, passou o ponto, largou a cruz, pediu o chapéu, teve contusão, deu uma chance para as novas gerações. Sei lá, invente! Perder o emprego é que não pode!

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