ANTENA
NO TELHADO
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Wesley
Nogueira
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Tudo pronto para assistir ao grande Final do Campeonato, os amigos convidados para o grande evento. Arrumou as cadeiras na sala, a cerveja comprada no caminhão - uma caixa inteira - já gelada, acondicionada na geladeira, os mais diversos petiscos sendo feitos ou já preparados. A TV de 29 polegadas, grande vedete do dia, estava no meio da sala, ele sentou de cadeira em cadeira, vendo se todos teriam uma boa visão, correu daqui ajustou dali, sempre olhando para a TV, ainda desligada, recolocando as cadeiras no local mais adequado. Logo a turma chegaria, ele orgulhoso, queria servir a todos muito bem. Agora, o ultimo detalhe: ligar a TV, ajustar a imagem e o som estéreo, um luxo, como dizia sua mulher. Ligou a TV e, para sua decepção, a imagem nem aparecia, só um grande festival de chuviscos e um som distante atestavam que ela estava ligada, tentou no controle remoto e nada, olhou as conexões atrás da TV, tudo certinho... e agora? Correu para o quintal a fim de avistar a antena, sobre a cumeeira da casa, de longe parecia tudo em ordem, mas sabia ele lá o que estava acontecendo, voltou à sala, e lá novamente tentou de tudo, mudou de canal, ligou e desligou, nada... tudo horrível, correu na gaveta e procurou o tal do manual da TV, ali poderia estar a solução... ledo engano, nada dizia a mais, mas mesmo assim ele comparou o desenho com as conexões e parecia tudo certo. Não tinha jeito, tinha que subir na casa, olhar se tudo estava ligado certo na antena. Procurou por todo o lado a escada. A mulher, para seu desalento, lembrou-o que tinham emprestado a escada para o cunhado, que estava reformando a casa, sempre o cunhado a atrasar a vida dele... cunhado não é parente, é encosto! Foi em busca de uma cadeira, pra subir no muro e de lá alcançar a laje e subir no telhado. Logo ao subir na cadeira, jogou a mão em cima do muro, justo em cima dos cacos de vidro que ele mesmo mandara colocar pra evitar assaltos, foi um corte razoável na mão. Voltou para pegar o carpete da sala e jogar em cima do muro, enrolou a mão em um pano e subiu na cadeira de novo, carpete por sobre o muro, subiu e de lá alcançou a laje do banheiro, de lá era só subir na cumeeira da casa e acertar a antena, caprichosamente assentada para ter a melhor recepção possível. Subindo na laje, tinha uma visão do quintal do vizinho, e a vizinha, só de shorts e sutiã lavava roupa no quintal, ela não era assim um espetáculo, mas a cavalo dado não se olha os dentes e ele ficou a observar um pouco a cena. A vizinha sentiu-se observada, aquele sexto sentido que quase todo mundo tem e não sabe explicar, olhou em volta, acima e abaixo e deu de cara com ele, lá em cima, visivelmente constrangida cobriu a seminudez com um pano que estava lavando e fez aquela cara de quem não gostou nem um pouco. Ele lá de cima, sem graça, disse: - Boa tarde, Dona Neide, eu estou aqui, tentando chegar lá na antena, a TV tá com problema... A mulher, num misto de desconcerto e indignação, nada respondeu, só entrou cozinha adentro, ele, tremendamente desconcertado continuou o seu alpinismo urbano, sentindo as telhas estalarem e uma ou outra quebrar com seu peso. Na próxima chuva goteiras novas apareceriam, ele já sabia, mas tudo pela Final. Chegou na cumeeira da casa e foi se arrastando até chegar ao pé da Antena, a bermuda que estava usando, novinha em folha, agora estava imunda e até meio esgarçada de tanto se arrastar pela laje e pelas telhas. Finalmente ali estava ele, sob a antena, olhou, tudo parecia normal, o conector parecia estar bem preso, mas quem sabe, poderia estar oxidado ou coisa parecida, para olhar, ele precisaria do alicate, que agora, ele achava que estava dentro da maleta de ferramentas, lá embaixo! - Ô minha Nêga... me trás o alicate - gritou ele em direção à cozinha. - Onde tá? - perguntou ela, lá embaixo - Na caixa de ferramentas, lá no quartinho. - É aquele do cabo amarelo? - É sim, esse mesmo.. - O Paulinho levou emprestado, não lembra? - Mulher, esse teu irmão não tem nada em casa? - Você que emprestou, não fui eu não... - E fazer o quê, ele já chega pegando... Trás o alicate de bico, é aquele do cabo laranja... O sol quente fritava os miolos dele, enquanto esperava, lá de cima viu o carro do Tarcísio estacionando, seus convidados já começavam a aparecer. - Amor... não tem nenhum alicate desses lá na caixa, você não emprestou esse a mais ninguém? - gritou a mulher lá embaixo. - Só se foi ao imprestável do teu irmão. - Não fala assim que ele é da família. - Da tua família, cunhado não é parente... é encosto... - Não fala isso, quando você precisou de fiador para comprar a casa, ele se ofereceu. - Claro, ele sabia que eu ia pagar, e além do mais, eu estava sustentando a irmã dele. - Olha... foi você que veio atrás de mim, eu tinha até namorado na época, e ele fazia engenharia, e acho que é mais rico que a gente agora... - Tá certo.. deixa quieto, vê se tem algum tipo de alicate por aí, meu benzinho, e vai lá fora, que o Tarcísio já chegou. Enquanto a mulher voltava, por falta de opção, ele olhou a paisagem por sobre os outros telhados, dali dava para ver boa parte do bairro, apesar do sol forte, um ventinho agradável começava a soprar, o papo pouco amistoso com a mulher há pouco, o fizera refletir sobre o casamento, ela não podia reclamar muito, realmente ele que se apaixonou por aquela morena que, apesar de alguns quilos mais gorda depois de 10 anos de casada e uma gravidez. ainda o fazia se excitar com aquelas camisolinhas transparentes, adorava aqueles seios fartos dela, estavam ficando meio caídos, mas fazer o que, ele também não era mais aquele jogador de futebol atlético que quase consegue uma vaga como profissional, a barriga já incomodava bastante e pra subir em cima da casa foi o maior sacrifício, sem contar que seu próprio telhado estava rareando, os cabelos caíam mais rápido do que nasciam. - E aí, Albertão... - a voz do Tarcísio o tirou de suas reflexões. - Desço já, só resolvendo um probleminha de última hora. - A galera já tá chegando amigão, o Osires não vem, tá com a sogra no hospital... - Que pena.. o que a sogra dele tem? - Duas casas e uns terreninhos.. - Brincou o sempre gozador Tarcísio. - Não brinca com essas coisas, seu pirado... o que ela tem pra estar no Hospital? - Parece que ela sofre de problema no pulmão... passou mal ontem à noite, pelo que ele me disse ao telefone. - Tá certo.. ô Nêga... e o alicate? - Não encontrei nenhum.. só achei uma chave de fenda, serve? - foi a resposta que veio da cozinha. - Não... Tarcísio, você não teria um alicate no carro? - perguntou esperançoso. - Que nada, amigão, nem estepe eu tenho, esse carro velho não tem nada a não ser um monte de defeitos. Sem opção, ele tentou prender o melhor possível os fios no plug. Seja o que Deus quiser, com sorte a TV estaria boa quando ele descesse. E lá foi ele de volta, descendo, devagar, mais uma telha quebrada, o que ainda custou uma brincadeira do Tarcísio: - Tá pesadão, hem, amigão, melhor reclamar com a patroa... Ela cozinha bem demais. Chegou na laje, e dali para o muro, coberto pelo carpete, foi aí que aconteceu: um escorregão e lá vem ele, muro abaixo, como um saco de batatas que cai do caminhão da feira. Felizmente o chão era fofo e ele não quebrou nada, mas passaria vários dias com fortes dores, quando a poeira baixou e ele viu a mulher e o Tarcísio tentando levantá-lo, a mulher, aflita, perguntando se estava tudo bem. - Tudo bem, foi só um susto... - Não quebrou nada? Tudo inteiro? - perguntava o amigo. - Sim, só dores, eu sou duro na queda... Bateu a poeira e constatou que a bermuda rasgara no fundilho, bermuda novinha... entrou no banheiro, se lavou e trocou de roupa, alguns arranhões no joelho também apareceram. Agora era a hora da verdade, tanto sacrifício para ver o jogo, ele foi na sala e ligou a TV esperançoso, decepção total, nada mudara... e agora, o resto da galera estava chegando. Frustrado, ele perdeu de vez a linha e começou a dar pancada na TV, o filho, assustado, veio correndo e perguntando: - o que foi papai? - Esta porcaria que não funciona - Funciona sim, Pai, ontem eu joguei video-game nela o dia todo, para ela funcionar, basta mudar a chave pra antena, tá na posição para o vídeo-game. O Menino foi numa caixinha, e mudou a chave, a Imagem apareceu limpa e o som cristalino chegou aos ouvidos. Alberto pensou em tudo que tinha passado e em como teria sido mais simples ter prestado mais atenção no que estava ligado atrás... De cara amarrada, vendo que o jogo logo começaria, foi chamando o pessoal, tentou sentar na sua cadeira predileta, mas seu quadril doía tanto que ia ter de assistir o jogo em pé, ou encostado na parede, teve de tomar um remédio para dor, e portanto, a cerveja gelada não estava mais nos planos dele, álcool e remédio não combinam. Os amigos chegaram, tomaram da sua cerveja, comeram da sua comida, e no final seu time ainda perdeu nos pênaltis, para decepção da maioria, exceto do Tarcísio que sempre torcia contra para gozar todo mundo. Foi na calçada despedir-se do pessoal e ainda viu dona Neide, a vizinha olhando com ar reprovador para ele, como quem diz "tarado"... Realmente esse era um dia para esquecer, daqueles dias em que você quer apenas ir para cama dormir cedo para passar mais rápido, aí ele lembrou que ainda ia ter de dormir de bruços, porque as nádegas estavam roxas da queda e doíam demais. |
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