FIDELIDADE
ELETRÔNICA
Maurício Cintrão
Nestes tempos de Internet, falar em fidelidade como nos velhos tempos é estranho. E eu me refiro ao sentido clássico da palavra, não ao conceito de mercado. A chamada "fidelização do cliente", dos comerciantes, tem mais a ver com prática do que com conceito, propriamente dito. Pois é fiel o cliente que continua comprando. No sentido antigo, é fiel quem não "compra" mais nada.
Pois, como eu falava, nestes tempos de Internet, é difícil não comprar mais nada. Pois as pessoas estão descobrindo novas formas de relacionamento e diversão. Muita gente interessante, que não seria descoberta no cotidiano, acaba surgindo nas vidas das pessoas através da tela do micro. Sólidas amizades começaram assim. Vários se apaixonam trocando mensagens em salas de bate-papo. Alguns fazem sexo pelo computador.
É estranho, à primeira vista, eu sei. Especialmente se você não tem intimidade com e-mails e salas de bate-papo. Mas esse fenômeno acontece em grande escala. Vale lembrar que não é de hoje que se ama montando frases. O princípio é o mesmo que fez dos poetas amantes imbatíveis há muitos séculos. Portanto, conhecer, ganhar intimidade e amar apenas através de palavras e frases não é tão difícil assim, muito menos inédito. Nessa horas, todo mundo lembra daquele filme "Nunca te vi, sempre te amei".
Pois esse jeito verbal de amar eletronicamente pelas palavras já desperta a gula das comunidades acadêmicas. Ainda vai ser motivo de muitas discussões acaloradas sobre comportamento humano. Vai ter muita gente ganhando dinheiro com teses e mais teses sobre a loucura ou a lucidez dos relacionamentos via Internet, dependendo do ponto de vista.
Um fato é irrefutável. Tem gente solitária rompendo a barreira da solidão através do computador. E tem gente insatisfeita que está compensando a solidão do casamento ou do namoro com as companhias eletrônicas. É claro que tem gente dando com a cara na parede com fantasias que não se realizam na vida real. Apaixona-se por um apelido da Internet e uma personalidade traçada em letras que não resistem a um simples encontro pessoal. Há, entretanto, casos de amigos eletrônicos que transferiam paixões duradouras dos teclados para a vida real.
O irmão de um colega de trabalho largou tudo - emprego, casa, sítio, família, status, cachorro e papagai - e foi morar com a namorada eletrônica na Bahia. Continuam juntos, há anos, sem curto-circuito. E as notícias mais recentes dão conta que eles continuam teclando na Internet com várias pessoas.
Mas o caso mais curioso, e que mostra bem esse nova relação com a fidelidade, é de parceiros casados que aprenderam a conviver com os amigos e amantes da Internet. Sei de um casal que mantém, em casa, dois computadores, lado a lado, para teclar na Internet juntos, cada um com seus amigos e, eventualmente, juntos com os mesmos amigos. Conversam, namoram e até vão aos "finalmentes pelo teclado" com amantes eletrônicos absolutamente às claras. Até onde sei, os dois se adoram e são felizes juntos, incluindo a Internet.
Aí eu me pergunto: será que esse pode ser o começo de uma nova revolução dos costumes? Deixo para vocês a procura de respostas. Mesmo porque, não sou acadêmico e minha gula continua sendo por doces e salgados, não nessa ordem, necessariamente.
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