ESTRANHOS AO LUAR
Pedro Brasil Jr

A noite era de Lua cheia, claríssima, com alguns cúmulos prateados que deslizavam pelo céu compondo estranhas formas. No estradão, em meio aos eucaliptos enfileirados, vínhamos cavalgando paulatinamente enquanto falávamos sobre as maravilhas da natureza, como aquela visão inigualável de uma noite que mais se parecia como uma manhã radiante.

Tentava explicar ao capataz, com linguagem simples, sobre a atuação dos astros em relação à Terra, como a influência da Lua nas marés e conseqüentemente na pesca, sobre os raios do Sol que rebatiam na Lua e refletiam na Terra aquelas tonalidades que nenhum artista seria capaz de reproduzir numa tela. Jeremias apenas ouvia com atenção. Às vezes, fazia reluzir seu inseparável isqueiro, quando acendia o seu cigarro de palha. Noutros instantes, cuspia o sarro que lhe vinha à boca. Eu seguia admirando o panorama e ao longe, aqueles capões de araucárias me permitiam vislumbrar as mais instigantes formas que, durante o dia não se fariam presentes Mas o estradão parecia não ter fim e as aves de rapina cruzavam pelo caminho em vôos baixos nos desviando a atenção. Foi num desses momentos, que Jeremias finalmente disse alguma coisa:

- Sundara está caçando!

Eu assenti com a cabeça e percebi que nos aproximávamos do ponto mais alto da fazenda. Dali podia-se observar tão distante que até mesmos os próprios olhos não acreditavam. O brilho do luar deixava emoldurar a cena mais espetacular que uma noite poderia permitir e lá, no distante, aqueles pinheiros eram, de verdade, os atores de um espetáculo sem roteiros e sem diretores. Eles eram senhores absolutos daquele horizonte prateado que escondia fábulas, crendices e muitas verdades inacreditáveis. Estórias de caboclos e mateiros e causos narrados por caçadores e pescadores que se aventuravam naquela imensidão.

Jemerias me falou da mula-sem-cabeça, do curupira, do saci pererê e até do São Jorge dando fim ao dragão naquelas entranhas da Lua. Difícil foi explicar cada caso para ele, nascido ali e tão acostumado àquelas credinces. Ouviu-me com atenção, pensou um pouco, mas manteve a sua crença acima de tudo, mesmo quando questionei se havia visto algum daqueles seres que assustam a gente do mato.

Pois bem; agora estávamos começando a pegar uma descida íngrime e os eucaliptos mais altos estavam à nossa frente permitindo que a Lua se posicionasse em outro ângulo, aparecendo por entre os galhos das árvores. Bem lá na frente, o capão começava a crescer à medida em que avançávamos e num repente, bolas-de-fogo começaram a surgir à nossa frente. Os cavalos até ergueram as orelhas, mas não ficaram alterados. Jeremias sim estava assustado, ou melhor - apavorado.

- Calma rapaz - disse eu! - Não se trata de nenhuma assombração...

Não foi suficiente. O coração de Jemerias batia tão acelerado que, naquele silêncio, era possível ouvir seus compassos.

Tentei explicar sobre o fenômeno da decomposição de animais mortos que provocam aquela reação, mas não tive nem tempo de levar o assunto adiante.Apenas ouvi o seu grito de "eiiiaa!!" - e lá se foi Jeremias numa cavalgada tão veloz que desapareceu pelo estradão deixando apenas um poeirão que, misturado ao ar e recebendo aqueles raios de luz, permitiram aos meus olhos, por alguns instantes, terem a ilusão de que as bolas-de-fogo estavam vindo em minha direção.

E não é que elas passaram como dois raios por sobre minha cabeça? - O cavalo empinou e me jogou longe. Quando me recuperei da queda, Jeremias já havia desaparecido no horizonte, o meu cavalo tinha se embrenhado pela mata e os corpos estranhos que haviam singrado o ar, foram para o alto e desapareceram entre as estrelas. 

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