ENIGMA
Mauro Pereira da Silva

A porta sempre estava trancada, ele havia percebido isso, mas a pancada na cabeça da enfermeira e o roubo da chave que ela cuidadosamente levava consigo, resolvera o problema.

O próximo passo era o corredor, um longo corredor que ele, apesar de estar ali há pelo menos trinta dias, estranhamente não tivera autorização para sequer ver. 

Desde o princípio ele havia desconfiado daquele hospital. Pior mesmo, era a completa falta de lembranças. Por mais que tentasse se lembrar de alguma coisa, não conseguia. Havia sempre o mesmo vazio em sua cabeça, a mesma sensação de que não havia passado, não havia do que se lembrar. Sua vida anterior àquele hospital parecia não ter existido.

Tentara conversar com a enfermeira, com o médico, um senhor sisudo que evitava olhá-lo nos olhos, mas eles evitavam conversar. Eram estritamente profissionais, caladões, passavam uma imagem de eficiência. Só depois de um certo tempo, começou a achar que aquilo não era profissionalismo. Desconfiou que era outra coisa, um certo pacto entre ambos para não comentarem nada. E ele desesperado, querendo saber como tinha ido parar ali, naquele hospital silencioso, que parecia não ter outros pacientes. E aquelas manchinhas em seu braço!... Haviam lhe dito que eram sinais de injeções que haviam lhe aplicado quando estava desmaiado, após o acidente que, segundo lhe contaram, ele foi vitima.

Mas não eram sinais de injeções. Simplesmente porque eram por demais finas, com uma mancha roxa em volta, como se alguma coisa, não uma agulha, tivesse encostado e sugado seu sangue.

O corredor estava ermo, não havia outras enfermeiras. Ele andava nas pontas dos pés, sorrateiramente. Atravessou mais portas, outros corredores e não encontrou ninguém. 

Passou a confirmar suas suspeitas. Havia algo de estranho naquele hospital. Nunca vira um hospital sem enfermeiras andando de um lado para outro, sem médicos, sem macas, sem movimento. As palavras eram estas: sem movimento.

Subitamente apareceu um homem que, ao vê-lo, fez um som de surpresa, mas desabou quando recebeu uma pancada na cabeça. Ele tinha conseguido retirar da cama um pedaço de ferro. Puxou o corpo, enfiou dentro de um armário e continuou andando, os pensamentos fluindo em sua cabeça.

Acabou saindo em um quintal com algumas plantas e percebeu que teria de pular um muro com mais de dois metros de altura. Na primeira tentativa, não conseguiu. Tornou a pegar impulso e desta vez teve sucesso.

Ofegante, já ia pular para o outro lado quando olhou para o céu e teve a plena certeza de que alguma coisa estava errada, muito errada.

Não havia uma, mas sim duas luas imensas brilhando no céu inundado de estrelas.

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