FANTASMAS - OPUS 5
Samuel Silva

Eu não sei se você acredita em fantasmas, mas eu acredito (também acredito em duendes, fadas, bruxas, princesas bondosas e príncipes de nobre coração, seleção brasileira de futebol, extraterrestres, dragões, saci-pererê, boitatá, político honesto, curupira, regeneração de criminosos através do sistema penitenciários, na remissão dos pecados, etc.)!

Eu acredito porque não só já vi fantasmas com convivo com eles, normalmente bem. São muitos e muitos estes que conheço, indo e vindo, ora na minha casa, hora em hotéis durante minhas viagens, até em aeroportos e aviões já os encontrei.

Alguns vão e vem, outros surgem e desaparecem sem deixar vestígios ou saudades, outros mais gostaria que se fossem, mas permanecem efemérides ciclotímicas em minha vida.

A maior parte deles querem apenas contar suas histórias ou contar histórias que ouviram contar e se sentem bem quando encontram um de nós, humanos vivos, que lhes dê ouvidos. Eles até têm um nome para estes de nós, mas agora me fugiu. Se eu me lembrar, eu digo.

São fantasmas e não anjos-de-provérbio e então têm sexo, virtudes e defeitos; alguns são sérios, outros brincalhões, quase todos são no mínimo interessantes por si ou por suas histórias.

São fantasmas de mulheres e homens traídos ou que traíram, jovens, "maduros" ou velhos, que tiveram paixões ou passaram ou foram deixados aos largo das emoções; são frígidos ou ninfomaníacos (?), sadios ou doentes, heterossexuais, bissexuais, homossexuais, transexuais ou travestis; de todas as raças, credos e religiões e ainda mantém muitas de suas convicções, aliás, fantasmas não mudam, estão condenados a serem como são, cada um com suas peculiaridades, personalidades, gostos, habilidades, vícios, virtudes, etc., imutáveis no tempo e infensos às mudanças de qualquer natureza. 

São o que são ou se tornaram, mas então deixaram de tornar.

Tenho aqueles a que mais me afeiçoei:

O senhor inglês gordo e fundamentalmente bom e altruísta que se vê muito melhor do que a maioria das pessoas o têm em conta, com sua pretensão alimentada permanentemente por um grupo de outros quase tão pretensiosos quanto ele e que se servem dele como líder e modelo. Acha-se aventureiro, estudioso do homem e da natureza humana; é leal, mas pomposo, generoso sem ser esbanjador, sempre pronto para os pequenos prazeres da vida, mas arredio aos grandes, donde um pouco desinteressado do sexo e do amor.

Tem aquele guerreiro de incríveis batalhas, paradigma exemplar do homem nobre, corajoso, honrado, ideal da velha Cavalaria. Discreto até no comedimento da fala e de gestos, é um líder nato e naturalmente seguido; respeitado pelos adversários e inimigos. Reúne em, aparentemente, tantas virtudes que alguns mais fracos, tomados pelo sentimento de inferioridade impotente da inveja, agem contra ele por meios covardes, insidiosos. Mas ao par de todas estas qualidade, é frio implacável e ambicioso, acreditando-se predestinado a um lugar elevado por direito absoluto, quase divino apenas pelas sua relações de sangue.

E o velho altivo, dado a velhacarias e ardis, truques dentro de truques, um ilusionista anacrônico defendendo idéias e ideais ultrapassados, como ele próprio, mas postando sempre como paladino não-violento do Bem, dos bons valores tradicionais, da liberdade. Eu nunca sei quando mente ou quando uma ação sua não esconde uma outra intenção ou objetivo que não quer que conheçam. Jacta-se de seus conhecimentos e de sua capacidade de raciocínio e foi um grande e poderoso conselheiro de um homem também grande em sua época mas que devia ao velho mágico tanto sua posição quanto seu poder. Mas é um excelente contador de histórias, principalmente as fantásticas, mágicas, esotéricas!

Uma mulher, brasileira, morena, de erótica ambigüidade, olhares sedutoramente femininos e na qual percebo uma moral sexual resiliente, pornográfica, que me excita imaginar se materializando em coitos e atos.

Eu disse, são tantos os fantasmas que conheço - e sei que ainda conhecerei outros tantos vezes tantos - que não posso listar aqui sequer os que mais gosto de rever. 

Meus adoráveis fantasmas: Picwick, Aragorn, Merlin, Capitu, apenas para nomear os que descrevi e estaria ainda nos próximos anos descrevendo cada um deles e ainda assim não findaria minha enumeração. E esses seriam os bons ou inofensivos, pois tenho também os nocivos e malévolos, que são outras histórias.

Escritores, como a Morte, as maldições e danações, criam os fantasmas.

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