MERGULHAR E CONHECER AS
PROFUNDEZAS
Mariazinha Cremasco
Estrada livre. Cento e dez quilômetros por hora, velocidade limite máxima permitida. Estou no banco do passageiro. Olho o retrovisor e vejo um carro que calculo estar a cento e quarenta
quilômetros por hora. Vejo-o aproximar-se. Vai nos ultrapassar pela direita. Parece que vai crescendo no espelhinho, crescendo, crescendo. Mais, mais, mais. Calculo o exato momento em que deveria abrir a porta e saltar, atirar-me do carro em movimento. Rápido demais. Eu foderia dois motoristas.
Décimo quarto andar de um prédio. Olho o movimento da rua abaixo do parapeito
de grades relativamente baixas. Um frio percorre minha espinha. Pular. Sentir por alguns segundos a liberdade de voar para, logo em seguida,
estatelar-me no chão. O fim.
O trem. O buraco do metrô. Seria muito rápido. Pisaria fora da linha amarela. Novamente calcularia a hora do arremesso para a morte. Quando o trem parasse totalmente, tudo estaria acabado.
Boca de fumo, boca do lixo. Chegaria e olharia de frente os marginalizados. Abriria o peito e a garganta e diria meus melhores palavrões. Aqueles que falo quando quero provocar realmente alguém. Um punhal ou vários. Um tiro ou muitos tiros. O final.
Dormir. Fechar todas as portas dos armários. Fechar todas as gavetas para prender esses fantasmas que atormentam.
Eles ficam presos nos armários e gavetas só enquanto durmo. Mas estão eternamente soltos em minha mente. Acho que nunca me deixarão em paz.
Mergulhar... e conhecer as profundezas.
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