O POVO
Eraldo da Silva

Estava no meio deles, também estavam meus amigos de escola, se perdíamos as aulas de física e matématica, ganhávamos em aulas de história e organização social e política do Brasil. Jamais aprenderíamos na sala de aula o que estávamos presenciando.

O paço municipal de São Bernardo do Campo, era o centro do país naquele dia, um dos últimos comícios pelas "diretas-já". Muitos políticos, dos quais a maioria já tinha servido à ditadura, mas isto não importava, o desejo de liberdade e democracia plena era mais forte que as convicções individuais.

O povo presente, aplaudia qualquer discurso que conclamasse a verdadeira democracia, não importava o passado do locutor. Havia muitas bandeiras, de todas as cores, mas as verdes e amarelas predominavam.Os olhos de todos brilhavam, a esperança de dias melhores era uma certeza. 

Eu ficava atrás daquela multidão, sentia a força e o poder que a união proporciona. Ninguém podia segurar aquela vontade incontida de participar, escolher, cobrar e decidir o rumo da nação.Os gritos, os aplausos e vaias, saíam do coração de cada um, o som emocionava, fazia refletir sobre nossa sociedade.

Não haviam diferenças sociais visíveis, todos conviviam pacificamente em torno de um único objetivo.Um povo, uma só nação. Estavam acostumados a conviverem juntos, aprendiam o respeito ao ser humano desde cedo, na escola e nas brincadeiras de rua. 

Com certeza não eram em sua maioria, bons cantores, mas a execução do hino nacional, saiu impecável, sem descompassos, ou desafinações. A emoção tornava perfeita a regência. 

Mas quem era o maestro?

O nacionalismo. Não o nacionalismo doentio, que julga um povo, raça ou território superior a outro.Mas o verdadeiro, que sabe do que é capaz um país quando se une e planeja seu futuro, que se preocupa com o próximo, que respeita os direitos individuais garantido na lei.

O mal sabia que podia ser vencido facilmente, mas nunca deixaria de atrapalhar a vontade do bem. Lutaria com as regras adquiridas pelo povo, tentaria confundir e convocaria a nação, para apoiá-lo, com as cores da bandeira. Mas os filhos daqueles que vi, não aceitaram, pintaram suas caras de preto da indignação e protestaram nas ruas, mostrando que estavam atentos.Se precisassem lavariam até a sujeira por onde pisassem os inimigos da justiça e assim fizeram.

A luta de um povo contra o mal nunca termina, não existe um líder específico do lado das trevas, é um conjunto de forças malígnas que agem de uma forma organizada, seus colaboradores são corruptos, gananciosos, traiçoeiros, tentam minar as forças do povo, sua união. 

O único jeito de acabar com a união de um povo é separando-o, dividindo em classes raciais ou sociais, o Brasil é um país multiracial, não teria nenhuma motivação para o ódio racial, então as trevas preferiram separar por classes sociais, a longo prazo, já que não era mais possível com aqueles que venceram e conquistaram seus direitos.

As crianças passaram a ser o alvo desta separação, justamente na idade de sua fomação moral: A idade escolar.

Os abastados para uma escola melhor, classista, particular, com seus muros altos e ônibus na porta.O resto, com o que sobrasse das escolas públicas, abandonadas nas periferias, com suas greves interminadas, drogas e violência.

Assim hoje estão separados, sem relacionamento humano um com o outro, sem se conhecerem.Crescerão cada qual dentro de sua casta, não aprenderão que são iguais, mas sim diferentes.

Será que não estamos criando em nosso próprio país a mesma separação que foi feita na África do Sul?

Se lá havia uma motivação racial idiota, é menor a motivação social?

Existe a esperança que o povo repense esta nova fórmula imposta pelos fantasmas da sociedade, que é a separação das crianças em sociedades diferentes, para que não haja no futuro um choque social incontrolável.

Nada justifica uma sociedade ser dividida, nenhum país do mundo se beneficiou por ter agido desta forma, exemplos não faltam no mundo, principalmente na África onde os colonizadores não se misturaram com os nativos.

A história do Brasil sempre mostra que o povo reage ao mal, mesmo que tardiamente. Talvez fosse a hora de um novo movimento:

"União Já!"

fale com o autor

Para voltar ao índice, utilize o botão "back" do seu browser.