OH! MARIDO INFIEL
Bruno Freitas
"Meu amoreco, meu docinho de côco... Jamais pude esquecer sua respiração junto a minha... Seu peito musculoso e peludo junto aos meus seios nus... Sua coxa sobre minha coxa... Jamais pude esquecer nossas tórridas noites de paixão. Fazem três meses que não nos vemos...".
Não precisou de mais nada, para o casamento de apenas um ano ir por água abaixo. Ela estava enfurecida com aquela carta de fundo de gaveta, que não sabia o que fazer, pra quem ligar, nem quem aborrecer...
O telefone tocou num dos escritórios de uma multinacional, e demorou para ser atendido.
- Alô?
- Eu queria falar com o Afonso?
- Um momento, por favor...
A espera foi eterna e o silêncio do outro lado da linha aumentava sua ira e a cada momento que passava, o ódio crescia, o mesmo quanto diminuíam as chances que Afonso tinha.
Afonso estava muito ocupado com um novo projeto muito vantajoso para sua companhia, que mal teve tempo de correr ao telefone, e ouvir a voz rouca e choramingosa de sua mulher do outro lado da linha.
- Acabou!
- O quê?
- Acabou tudo!
- O quêêê?
- Não quero ver você, nunca mais...
- Meu Deus! O que é que aconteceu?
Afonso nem teve tempo de terminar a frase para ouvir o telefone desligar. Seu desespero não foi maior por não ter idéia do que acontecia. Tentou retornar a ligação, mas foi em vão... O telefone andava ocupado... Parecia que Glorinha, atacada de fúria e histeria, havia atirado à parede todas as chances de comunicação.
- Ele tem outra... Mãeeee...
- Que isso filha... É besteira sua...
- Não é não... Eu vi uma carta de amor que ele guardava na gaveta...
- Que isso, minha filha...
- Tá aqui na minha mão...
O telefone continuava ocupado, e Afonso, sem saber o que fazer, desculpou-se no trabalho, e foi pra casa desesperado com o fim de seu matrimônio. No caminho nem podia imaginar o que tinha acontecido, e nem mesmo sabia o que causara a fúria repentina de Glorinha.
Glorinha até pensou em ir pra casa de sua mãe, mas lembrou que também tinha direitos sobre o imóvel, e sentiu uma coragem lá no fundo, que as roupas do cônjuge formaram uma cascata de tecido que jorrava do segundo andar do Edifício das Flores, 23.
Quando Afonso chegou em casa, todas suas camisas sociais já estavam na rua, estavam também suas bermudas, suas sungas, cuecas, seus pijamas, e os pares de meias. Faltavam os sapatos, os ternos, os blazers, os chinelos, toalhas de banho e o jogo de lençóis de sua tia Maria.
- Glorinha?
- Cachorro, desgraçado, mal agradecido...
E continuava a jogar os pares de meias, que ficavam presos nos galhos da árvore em frente.
- Para com isso Glorinha! Você tá louca?
- Louca? Vou te mostrar quem está louca...
Lá veio a velha radiola, que nem mais funcionava, mas era guardada como relíquia de família.
- Para Glorinha... O que é que foi?
- Seu cachorro! Você vai me negar agora, né?
Vinham os discos, as fitas, os livros, e a maldita camisa do flamengo...
- Negar o quê?
- Tá vendo essa carta aqui?
Glorinha sacudiu a carta no ar, pelo lado de fora da janela. O papel amassado parecia querer se romper a qualquer segundo.
- Que é que tem?
- Não falei que você ia negar...
- Negar o quê?
Glorinha desdobrou o papel amassado com cuidado para não rasgar.
- Sua amante... Sua amante...
- Que amante? Cê ta vendo fantasma? É?
- Tá aqui escrito... Ó...
Glorinha abriu a carta e começou a ler em voz alta.
"Meu amoreco, meu docinho de côco... Jamais pude esquecer sua respiração junto a minha... Seu peito musculoso e peludo junto aos meus seios nus... Sua coxa sobre minha coxa... Jamais pude esquecer nossas tórridas noites de paixão. Fazem três meses que não nos vemos, que estava até pensando em visitar essas bandas. Arrumei um trampo aí essa semana, e amanhã quem sabe nos falamos pra armar aquela cervejada... E vê se chama o Osmar... Meu telefone pra contato aí vai ser o 3432-8903. Nos vemos amanhã... E antes que eu me esqueça:
Vai se fuder!
Um abraço, Mario.".
Para voltar ao índice, utilize o botão "back" do seu browser.