O PESO DO SUSTO
Juraci
A noite estava gélida e eu cansada. A última lâmpada da rua a apagar indicava que era madrugada alta. Volto para casa. Subo a escada sem acender a luz, entro no apartamento também em penumbra quase escuridão. Sobre o tapete deixo os sapatos para evitar o toc-toc. A bolsa atirada sem rumo, para qualquer direção, esbarra na parede deixando objetos espalhados com o agravamento de um espelho trincado. "Ainda bem que não há vampiros por aqui" - penso quase satisfeita. Não pretendo acordar os espíritos. Dizem que eles ficam nos canto das casas observando os nossos movimentos. Erra quem não acredita nisso. Não me refiro almas do além, sim, a espíritos vivos que por uma razão ou outra entram em casas não suas.
Olho para o espaço longo e o medo de atravessar a sala é maior que o perigo que acredito me esperar.
Tento tirar da mente que tudo não passa de uma impressão desagradável. Avanço e sem olhar para os lados, piso com força na cerâmica gelada. Desequilibro e caio sobre um vivente que impede a minha passagem. O meu grito soa estridente misturando-se com a dor e a ânsia de defesa do invasor. Travo uma luta corporal com o meu agressor ou, quem sabe, vítima. Na minha face, ardendo como pimenta malagueta, o sangue corre devagar. O negrume do ambiente se mistura com a negritude do animal. Unhas afiadas riscam sobre minha pele. Numa fração de segundo, encontro forças e o soco faz o animal rolar para o sótão subterrâneo numa giratória alucinante. Enquanto descia, pude observar os seus olhos grandes de vaga-lumes quase saindo da órbita.
Murmuro comigo mesma:
"Quanta confusão um gato preto pode causar". Só aí percebo que já é um novo dia e uma sexta-feira treze.
Entro para o quarto e mal dou conta de rodar a chave. Derramo-me toda sobre a cama que parece tremer comigo. Fecho os olhos e procuro o sono que não vem.
A madrugada sede o lugar completamente para o dia e eu ainda busco o sono.
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