CASO DE CONSULTÓRIO
Ubirajara Varela

A mulher entra afobada no consultório do médico.

- Bom dia. O que traz a senhora aqui?

- Doutor, estou com dores terríveis pelo corpo. Tá muito difícil de suportar!

- Sim. Prossiga.

- Parece que martelaram na minha cabeça. Minha mãe sempre reclamou de enxaqueca e eu fazia pouco caso. Agora eu entendo o que ela dizia.

- Dor de cabeça... E o que mais?

- Em torno dos meus olhos, doutor. Dói bastante. E tem também estas olheiras fundas que surgiram.

- Há quanto tempo?

- Desde que mudamos para o novo apartamento, faz umas duas semanas. Morávamos no décimo terceiro andar. Agora estamos no térreo. É bom. Bem ventilado... Mas cheio de mosquitos. Fica aquele zunido desconfortável durante toda a noite. E tem mais... O medo de ladrão. As janelas não têm grades. Fico meio insegura e não durmo direito.

- Sei. Continue, por favor.

- Estou com uma fraqueza tremenda também. Sem ânimo pra nada. Apática mesmo. Eu, que sou conhecida pelos meus colegas como a atividade em pessoa porque sou mãe de dois, dona de casa, trabalho fora e ainda arrumo tempo para a ginástica, ando vivendo de sono e preguiça. Até meu marido está reclamando da minha falta de pique para os compromissos conjugais.

- Hum...

- Às vezes, doutor, eu acordo no meio da noite por conta dos zumbidos dos mosquitos, já com a cabeça rodando... Sinto fortes náuseas, sabe?! Muitas vezes me provocam vômitos.

- Mais alguma coisa?

- Sim. Apareceram estas manchinhas vermelhas pelo corpo.

- Algo mais?

- Olha, doutor. Vou confessar uma coisa pro senhor. Sou uma pessoa cujo maior prazer da vida é comer. Posso me gabar de ser boa de garfo. Aprecio um bom prato. Aliás, todo dia eu rezo com fervor, pedindo perdão a Deus pelo pecado da gula (e a mim mesma pelos quilinhos extras). Mas acontece que eu ando sem apetite nenhum ultimamente. Que tristeza!... E por falar em fervor, também estou me achando um pouco febril.

- Certo. Pode se sentar ali na cama.

O médico, como bom profissional, examina minuciosamente a cliente.

- Mostre a língua, por favor!

- Aaaaah!...

- Hum... A cor não está boa. Deixe-me ver os olhos. Dilatação normal. Mas a cor também não está satisfatória. Vamos tirar a pressão.

A mulher estende o braço. O médico aproveita para medir a temperatura também.

- A pressão e a temperatura estão um pouco altas. Mas não precisa se alarmar.

- Eu não disse?!

- Pronto. Pode voltar para a cadeira.

- Obrigada.

- Olhe... O caso é simples de se resolver. Vamos por partes, então. Para as dores ao redor dos olhos, olheiras e náuseas, sugiro um pouco de descanso e repouso, coisa que a senhora conseguirá colocando grades nas janelas. Ainda para conseguir dormir melhor, use um bom repelente para os mosquitos, à base de citronela. É natural. Não prejudica a saúde. Umas boas noites de sono darão jeito também na falta de ânimo.

- Mas doutor...

- Para a inapetência, basta não se sentir tão culpada. Um pouco mais de moderação será suficiente.

- Mas do-u-tor...

- As manchinhas são uma micose. Esta pomada dará jeito. Para a dor de cabeça e a febre, sempre que voltarem, pode tomar uma aspirina, ou qualquer outro similar, à base de ácido acetil salicílico.

- Doutor... Eu julgava que estava com dengue! Os mosquitos... os sintomas... Esta fórmula é proibida nestes casos, não?

- Certo. Porém a senhora não está com dengue. O transmissor da doença tem hábitos diurnos e não faz zumbidos. A senhora está é com dengus excessivus. Vou prescrever uma licença de três dias para se recuperar. Chegue em casa. Relaxe. Converse com o seu marido. O remédio que a senhora está precisando é carinho e atenção. O estresse sobre a senhora está demais.

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