ALICE É O REI
Luciano Cesar Cunha

Alice decidiu fazer um castelo de cartas.

Alice começou a colocar as cartas uma a uma, com o maior cuidado pra não deixar cair nenhuma.

Alice demorou um pouco pra conquistar habilidade, mas já começava a dominar o jogo e ia equilibrando uma carta nas costas da outra.

Alice ia arranjando as cartas pra fazer um castelo bem firme e assim chegar bem alto.

Alice percebeu que as últimas cartas eram figuras e achou que assim iria até ficar mais bonito.

Alice colocou a rainha deitada e ia colocar o valete e o rei em cima pra fechar.

Alice escutou o rei reclamar porque ele queria ficar no alto sozinho.

Alice tentou explicar que não dava pra deixar uma carta só no alto.

Alice ouviu o valete gritar que não queria ficar de costas pro rei porque não confiava nele.

Alice só queria brincar e não estava disposta a escutar reclamações e disse que as coisas iam ficar daquele jeito e pronto.

Alice viu que o rei contiuava a resmungar e ameaçava virar-se e jogar o valete montanha abaixo.

Alice viu o valete se virar e enfrentar o rei.

Alice perguntou à rainha o que ela achava de tudo aquilo.

Alice ouviu a rainha dizer que dia após dia o rei e o valete se enfrentavam, ora por inveja, ora por cobiça, ora por ira, ora por orgulho.

Alice pensou que aquilo era uma bobagem, que as coisas podiam ter sido diferentes e que qualquer carta poderia ter acabado no topo.

Alice ouviu o rei ordenar que o valete fosse retirado do castelo já, porque se sentia insultado.

Alice tentou explicar que, pro castelo ficar de pé, todos eram necessários e que o sete e o ás estavam lá embaixo se segurando um ao outro e não estavam reclamando.

Alice viu que todas as cartas de baixo começaram, então, a se inquietar.

Alice ouviu o três resmungar, o nove reclamar, o dois ameaçar, de repente todos queriam também estar no topo.

Alice virou-se pra rainha pra ver ela piscar...

Alice suspirou e o simples suspiro foi suficiente pra derrubar tudo num piscar de olhos.

Alice viu, de repente, todas as cartas no chão, todas lá, deitadas, mudas, imóveis.

Alice pensou no quanto elas foram mesquinhas e como o egoísmo delas arruinou o lindo castelo e concluiu que a rainha devia ser a única carta sábia.

Alice ainda ouviu a rainha dizer que castelo construído de egoísmo não tem alicerce e que acaba caindo mais cedo ou mais tarde.

Alice deixou todas as cartas no chão, todas no mesmo nível, lado a lado, umas por cima, outras por baixo, só pra elas aprenderem a lição, sem poder reclamar, nem fazer nada.

Alice pensou que, no fundo, o rei só era rei porque ela o chamava de rei, e que ela, Alice, era a única que podia tomar decisões próprias e agir, e que, se não fosse por ela e suas lindas mãozinhas movidas pela sua vontade, ninguém ia sair dali e nunca teria existido castelo nenhum.

Alice viu as cartinhas ali deitadinhas, sorriu e cantou "Alice é o Rei, Alice é o Rei, Alice é o Rei..."

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