CADA UM TEM A QUARTA-FEIRA QUE MERECE
Eduardo Salino

Não sei porque, mas nessas datas fico extremamente frágil.

Torço para que chegue logo a famosa quarta-feira de cinzas.

Tenho andado profundamente só. Até o dinheiro está distante.

Amanhã, terça-feira gorda, faço anos.

Vejam só: carnaval, véspera de aniversário, sem dinheiro, minha mãe no hospital e a namorada longe.

Essa quarta-feira terá um duplo alívio. O final do carnaval e a saída de minha mãe do hospital, onde realizara uma bem sucedida operação de vesícula.

Sem contar que para minha patota teatral, o ano começa agora.

Quando fico deprimido, gosto de andar de táxi.

Cada louco tem sua mania. Eu tenho a minha.

Quando fico frágil, quero proteção.

Só não peço colo, porque o leitor poderá pensar que me refiro ao colo do motorista do referido táxi. Um vexame.

Gostaria de pedir colo à minha namorada, porém ela está longe. Bem longe. Inclusive fisicamente. Sem contar que desconfio que ela seja muito ocupada com sua vida para poder adoçar minhas ternurinhas.

Resta-me apenas comer besteiras, ver filmes na TV cujo nome nem sei e jogar gamão pela internet.

Não consigo ler quando fico angustiado. Apesar de ter ido a duas livrarias e assistido dois filmes.

A única vez que quis ler angustiado foi quando meu pai estava à beira da morte, e eu estava no Rio Grande do Norte, mais precisamente em Natal, e rodei a cidade inteira procurando desesperadamente algum livro de Manuel Bandeira, que tivesse o poema Desencantos, que me deu um certo conforto.

Quando estava saindo do Rio Grande do Norte, já em outra cidade, recebi a terrível notícia.

Enquanto quase todas as livrarias de Natal tinham de sobra em suas prateleiras Sidney Sheldon e Paulo Coelho, apenas em uma encontrei a poesia de Bandeira.

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