GRRRR
Viviane Alberto

O telefone tocando, você do outro lado da casa. Numa corrida furiosa até atender o aparelho estridente, você vislumbra, pela milionésima vez, a necessidade de comprar um telefone sem fio, coisa que você vai esquecer em seguida, como das outras vezes. Atende, usando a última reserva de ar:

- Alô...

- Bom dia, senhora!

Como pode ser bom dia? Acabou o dia, se depois da maratona dos cem metros com barreira a criatura do outro lado já te chama de senhora, ignorando os potes de creme com ácidos retinóico, glicólico, hilaurônico e outras poderosas substâncias mais que você utiliza pra retardar a chegada desse pronome. Se eles dissessem 'bom dia, mocinha!' iriam agradar a gregos e balzaquianos, todo mundo ficaria feliz e a campanha de arrecadação seria um sucesso. Telemarketeiros, vão por mim!

- Sou Fullanya, da Associação dos Nwgrandsfg da Nova Pomerânia do Sul e gostaríamos de estar contando com sua ajuda no sentido de estar ampliando nosso alcance no atendimento etc. etc. etc.

Acreditem, pessoas que me ligam pra pedir contribuições via débito na conta telefônica: eu não vou autorizar. Não autorizo porque minha conta já me assusta normalmente, com todas aquelas taxas e serviços que aparecem sem que eu compreenda de onde nem porquê. Não autorizo porque vocês sempre ligam na hora errada; porque me chamam de senhora, quando eu ficaria feliz até com um 'broto' fora de época; porque seus gerúndios me dão arrepio paralisante e eu fico fazendo mentalmente as correções nas bobagens com as quais vocês assassinam o português. E não autorizo porque vocês são simpáticos demais, bonzinhos demais, atenciosos demais e isso me faz sentir um lixo, porque não sou assim tão simpática, nem boazinha, nem meiguinha e não faço idéia de onde fica a Nova Pomerânia do Sul. Além do quê, a gente aprende a desconfiar de gente muito fofa com o tempo. O homem é mau, muito mau, como já disse Marx.

Não me canso de fazer essa pergunta, como é que eles nos acham? Sabem o número do meu telefone, meu nome e pedem pra confirmar, sim, confirmar, o CPF! Imagina se não são capazes de manipular meu DNA?!

Mas o ataque não é apenas via Embratel. O perigo também nos ronda nos endereços eletrônicos. Antes eles só atacavam aqueles gratuitos, agora aparecem até nos que você recebe de seu provedor. Desde a semana passada uma grande editora me encontrou e quer porque quer que eu volte a ser sua assinante. Me manda mails muito bem bolados. Tão bem bolados que ontem li um até a metade e só então percebi que era mala direta. O que essa editora não sabe é que eu gosto muito de revistas, mas não gosto de ser assinante. Prefiro ter a liberdade de comprar meu exemplar na rua, tem problema nisso? Acho que não, mas eles não percebem ou não se importam com o que eu penso e vão atulhando minha caixa postal. Me deixando assim, mal humorada. Fazendo com que eu transforme uma crônica que deveria ser sobre simpatia numa prova cabal de que sou um poço de antipatia, uma chata, ranzinza, cri-cri.

Viram só porque eu fico tão irritada? Porque no final da história a culpa é minha, por não ser legal e fofa como os operadores que querem debitar automaticamente um dinheiro que eu não tenho, em função de entidades que eu não conheço. E que, daqui a alguns meses, podem estar envolvidas num daqueles escândalos 171 que a gente vê na televisão.

Sem dúvida nenhuma, a gente tem que ser solidário. O mundo está de um jeito que é só olhar pro lado, qualquer lado, que você já encontra alguém precisando de ajuda. E tem mesmo que ajudar, faz bem pros outros e pra você. Mas nos deixem optar, nos deixem ajudar de coração e não porque depois de cinco telefonemas de quinze minutos você se rende e autoriza a cobrança. Mala direta já é uma febre difícil de combater, sem alça então...

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