O MAR, QUANDO QUEBRA NA PRAIA
Luciana Franzolin

Ele disse para não ir sozinha à praia, com este tempo corpo vira pára-raio, com esta chuva, de verão, de frente fria, é um perigo, dar moleza para o azar. Meu pai falou, me viu saindo as dez da noite, de canga e sem biquíni, da casa para a praia do mar.

Enquanto largo o pano vermelho na areia doce, o oceano se acalma, e cessam as ondas que se enroscavam em minha canela, aerando, dançando, molhando os pêlos, a pele, sem nada. Cabelos de espuma de ondas. Escuros de noite sem lua.

O sal entra em mim, salgado, ardido, molhado. O mar é a lua, espelho de cheia, de maré baixa, de nuvem seca, de raios frios. O sal é o mar diluído, oxigenado. O mar é caldeirão com água, que mexe e gera ondas pequenas, que nem bacia que a gente gira. Quem gira a Terra sabe.

Suponhamos que sim, um raio reluzente de um relâmpago torto caísse em minha fronte, enquanto uma chuva fina com gosto de sal entrasse na boca. Suponhamos que enquanto eu estivesse andando, uma nuvem me espiasse e gostasse, namorasse.

Sendo ela positiva, atraísse a negativa, e desse encontro destoasse o desencontro, um clarão riscasse a atmosfera, e clareasse minha mente como iluminasse um Buda.

Se realmente um raio yin derrubasse o meu yang, tal qual o tao figurasse o amanhã, tal qual o claro numa noite densa e vã. Se tal raio me achasse lá na praia, sem saia, sem propósito, sem laia, seria eu a mais feliz no universo.

Morrer de raio, sem dor, sem amor. Seria a melhor morte que alguém podia esperar. Andando na praia, descalça, sem calça. Seria a melhor morte que alguém não podia esperar. Sem sentir, sem vestir, sem dormir. Ser pára-raio, só luz, só sol, só lua. Só terra, só mar, só sal.

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