AS DOZE BADALADAS
Rodrigo Stulzer Lopes
 
 
Primeira Badalada

Nunca pensou que doze segundos pudessem demorar tanto. O relógio da Matriz acabara de marcar meio dia e havia chegado a hora. Estava ali de pé, ao lado da forca. Uma multidão olhava-o com sede de sangue. Como as pessoas podiam se divertir com o sofrimento dos outros?

Segunda Badalada

Um tomate foi lançado juntamente com um grito de "Morra!". Ele teve que se desviar para não ser atingido. Suas mãos suavam e a garganta estava seca. Sentia uma pressão no pescoço tornando a saliva difícil de se engolir.

Terceira Badalada

Era verdade, estava relembrando toda a sua vida. Como um furacão lembrou de sua infância e das brincadeira de bandido e mocinho. Lembrou de sua mãe e do desgosto que ela deveria estar sentindo vendo-o neste momento.

Quarta Badalada

Engraçado com as coisas podiam passar tão rápidas pela sua cabeça numa hora dessas; e também coisas esquisitas e impróprias. Estava vendo na multidão uma mulher com que brincara quando era criança. Ela sempre deixava-o dar-lhe alguns beijinhos, mas quando cresceu não deixou-o mais.

Falsa, como todas as outras.

Quinta Badalada

O que uma pessoa pensa nos segundos finais de sua vida? Será que todos que iriam morrer pensavam da mesma maneira? Será que se arrependiam dos seus pecados?

Sexta Badalada

O padre sobe as escadas. Pára ao seu lado com o crucifixo na mão. Diz algumas palavras e faz o sinal da cruz. Retira-se rapidamente. Nem mesmo o padre olhou-o direito. Será que ele seria uma pessoa tão imprestável assim? O padre também teria a sua vez, todos teriam. Isso o deixava mais reconfortado.

Sétima Badalada

Pensou nos seus antigos amigos, mas não via nenhum deles por ali. Onde será que estavam, o que deveriam estar fazendo? Será que algum deles ficou rico? Será que alguém teve o mesmo destino medíocre dele? Provavelmente nunca mais saberia.

Oitava Badalada

O momento se aproximava e ele tinha que ser forte. Afinal, se uma coisa boa seu pai ensinou foi ser forte. As surras que levou realmente serviram para alguma coisa. O pai batia forte mas ele não chorava. Essa era sua vingança. Nunca dera-lhe o gosto de escutar seus gemidos. Isso o tornou uma pessoa dura e praticamente sem sentimentos.

Nona Badalada

O pânico começou a crescer mas se acalmou logo em seguida. Não adiantaria nada mesmo, agora era tarde demais. Iria encarar a situação de cabeça erguida, olhando para aquele bando de pessoas. Ele não era o louco. Loucos eram eles que saiam de suas casas aconchegantes para ver este espetáculo macabro.

Décima Badalada

Viu uma pequena menina chupando o dedo de uma das mãos; com a outra segurava uma boneca. Era a única entre todos que estava chorando. "Afinal alguém que se importava", pensou ele.

Décima Primeira Badalada

Um segundo. Era esse o tempo que restava. Os musculos da mão se contraíram.

Décima Segunda Badalada

A multidão silenciou, havia chegado a hora. Olhou para o céu e pensou: "Deus, me perdoe."

Olhou novamente para a multidão e para o padre. Olhou para a alavanca e moveu-a com determinação. As dobradiças do cadasfalso rangeram e o alçapão abriu-se. O equilíbrio foi perdido e a corda começou a se esticar. O pobre condenado caiu dando apenas um leve gemido. Tremeu, igualzinho como tantos outros que ele já tinha enforcado. Pelo menos este morreu rápido. Não demorou nem dois minutos e o corpo já estava imóvel. A multidão começou a se dispersar. Ele fez o sinal da cruz e desceu a escada de madeira.

Pensou novamente em largar aquele emprego. Ser carrasco não era uma tarefa fácil.

 
 
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