O NOME DA COISA
Eduardo Loureiro Jr.
 
 

"As palavras me antecedem e ultrapassam,
elas me tentam e me modificam, e se não
tomo cuidado será tarde demais:
as coisas serão ditas sem eu as ter dito
."
- Clarice Lispector -

Dar um bom título a um filme é tão difícil quanto colocar um bom nome numa criança - as Pedromárias, Aldegundas e Chananecos que o digam. Mas parece que os produtores de Hollywood já encontraram a fórmula perfeita para chamar a atenção do público, enganando-o é claro: trata-se de recombinar palavras de filmes famosos.

Se os filmes "O preço de um resgate" e "Vítima de uma paixão" foram um sucesso, por que não nomear um novo lançamento de "O preço de uma paixão"? (Esses filmes existem, não são invenção minha, não!)

E que tal recombinar as palavras de dois outros grandes sucessos, "Duro de matar" e "Ligações perigosas"?

Separadas as palavras "duro", "matar", "ligações" e "perigosas", poderíamos ter os seguintes filmes: "Duro e perigoso" (pornô), "Ligações de matar" (suspense), "Ligações Duras (ou Duras Ligações)" (espionagem) e "Perigosas de matar" (comédia homossexual). Todos sucessos garantidos, senão nos cinemas pelo menos nas locadoras de vídeo.

As combinações chegaram a um tal nível de elaboração que estão se tornando metalingüísticas, autorreferentes, como no já clássico "Matadores de Assassinos", combinação de "Matadores de aluguel" com "Assassinos por natureza".

Não será de se espantar se em breve surgirem novos títulos seguindo essa tendência: "Duros, sólidos e seguros" (drama de costumes), "Matar ou Assassinar? Eis a questão" (policial existencial), "Links e ligações" (comédia tecnológica) ou "Perigo de alta periculosidade" (documentário de ação).

Esta crônica, se a moda chegasse à literatura, poderia se chamar "Nomeando os nomes", o que faria dela a precursora de um novo gênero: a crônica em estado crônico.

E o leitor a leria numa leitura de letra por letra.

 
 
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