UMA NOITE DE SÔNIA
Luciana Ribeiro
 
 

Insônia é uma dessas palavras que eu acho engraçadas. Inveja é outra. Acompanhe meu raciocínio: existe inverdade porque antes existe uma verdade, assim como acontece com inconstância e constância, delicado e indelicado, incerto e certo.

Pois é, veja é conjugação verbal, não é um substantivo que seja o oposto à inveja. Além disso, esse veja aí, se fosse o contrário de inveja deveria mesmo é ser véja, assim aberto.

Seguindo esse brilhante raciocínio, a gente chega à conclusão que existe a "insônia" mas não existe a "sônia". Quer dizer, existe um monte de Sônias por aí, mas não é o oposto delas que nos deixa noites inteiras sem dormir. E apesar da proximidade sonora, não dá para dizer que sônia seja sinônimo de uma boa noite de sono, mesmo que origem do nome tenha alguma coisa a ver com isso.

Tem uma outra categoria de palavras engraçadas, aquelas que têm uma letra a mais ou a menos. Quer ver? Sobrancelha obviamente tem um m a menos. Todo mundo concorda que deveria ser sombrancelha, aliás, é assim que todo mundo fala. Até porque a sobrancelha tem tudo a ver com sombra, ela está ali para fazer uma sombrinha pros nossos olhos (para ser tirada pelas mulheres e para dar uma cara de mau a alguns homens).

Outra que tem uma letra a menos é muito. Você já viu alguém falar a assim "muito" sem estar resfriado? Aposto que não. Todo mundo que eu conheço fala "muinto".

Mas tem aquelas palavras com letra sobrando. Fala se chimpanzé não tem nada a mais. Claro que tem, esse m no meio do caminho, que deveria estar lá no muito. Aquele macaco simpático tem muito - ou melhor, muinto - mais cara de chipanzé que de um pedante chimpanzé.

Por fim, há as palavras que, além de ter letra a mais, têm letra trocada. Dão um drible em todo mundo. Acertou, a mais clássica delas é mesmo ela, drible. Essa jogada genial que fez do Garrincha um deus e encanta até mesmo quem não entende nada de futebol quando dita se transforma no maior adversário dos jogadores de futebol. Não em campo, já que zagueiro bom rouba a bola e zagueiro ruim dá carrinho, mas na hora da entrevista o drible derruba perna-de-pau e craque indistintamente (olha aqui outra que comprova a teoria lá de cima, o indistinto existe porque há o distinto).

Já ouvi até narrador de futebol falar dibre, que é a maneira como a jogada é conhecida pelos boleiros. Sem o r intruso (ih, achei outra da categoria da insônia! Ou você já viu um truso por aí?) e com o l devidamente trocado pelo r.

Tem outras palavras curiosas soltas por aí, como convescote e doravante. Mas essas são de outra categoria e ficam pra outra vez.

 
 
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