SENTIR CIÚMES DE MADRUGADA
Eduardo Loureiro Jr.
 
 
Ruim não era ficar a noite toda acordada. Pior era agüentar os gemidos do marido. O safado gemia sempre que estava sonhando. Ela não sabia o que a irritava mais, se o movimento rápido dos olhos dele, querendo sair das caixinhas, ou se aquele gemido sem palavras. Se ele dissesse alguma coisa compreensível, algo que ela pudesse acompanhar como num filme ou numa novela, tudo bem. Mas não. Ele só gemia. Em ritmo e intensidade diferentes, mas sempre e apenas gemendo.

Um dia ela se cansou daquela história, e o cutucou.

- Ahn... hein... - ele tentou falar, sem ter acordado direito.

- Vamos, acorda! - ela gritou, insistindo.

- É você? - ele tentou articular alguma coisa.

- Claro que sou eu. Esperava que fosse quem, essa infeliz com quem você sonha sem parar de gemer?

Sim, ele realmente tinha sonhado com alguém, pois estava com o pau duro. Resolveu aproveitar, e acarinhou a patroa. Ela se afastou.

- Agora tá querendo me agradar, é?

- Vem cá, benzinho. Era com você que eu estava sonhando. Vem, vem... - ele suplicou.

Ela cedeu. Eles fizeram amor. Ela finalmente dormiu, livre da insônia por aquela noite.

Desde então, sempre que ele geme, ela o cutuca, ele a abraça, ela se faz de ofendida, ele faz uma declaração de amor, eles se amam, ela dorme.

Quando ele não geme, ela o cutuca mesmo assim, ele a abraça, eles fazem amor, ela dorme.

Quem não dorme mais é ele, com medo de que seus gemidos se transformem em palavras, e que ela saiba que ele sonha com outra. Sempre. Deliciosamente. Mas, agora, só no escritório. Ele pede à secretária para não ser incomodado, e dorme, e sonha, e geme, e ama uma mulher que ele nunca viu acordado.

Se geme de vez em quando para a esposa, é porque nem só de sonho vive o homem. E também porque, depois do amor, ela dorme e ele pode tirar um cochilo, e sonhar, e gemer, sem que ela tenha um acesso de ciúmes.

 
 
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