HOMENS E BEIJOS
Maurício Cintrão
 
 
Pois eu falava da energia dos achocolatados e da movimentação muscular durante os beijos e acabei perdendo um mote interessante. Por isso, retomo o assunto, apesar de todos os riscos representados pela severa observação dos meus amigos da Gréia. É preciso falar mais dos beijos entre homens.

Houve poucos homens que eu beijei depois de adulto. O primeiro deles foi, sem dúvida, meu pai. Não nos beijávamos na face há muitos anos. Mas um problema no coração o levou à mesa de cirurgia. Ficou acabado, justo ele que era tão cioso da própria imagem. Pois na primeira vez em que nos encontramos (convalescia na casa dele), dei um beijo quase infantil naquela bochecha tão querida. E choramos os dois, porque há muito nos devíamos aquele carinho.

Outro homem que beijo quando encontro é o Oduvaldo, marido da Nininha, uma espécie de tio adotivo. Tenho por eles dois um carinho muito especial. Alimento um respeito especial por esse casal que empresta suas folgas para ajudar as pessoas. Eles foram decisivos em alguns momentos de minha vida. Um deles, triste, foi quando eu e Fátima, minha primeira mulher, perdemos um bebê. O Du e a Nininha salvaram a vida dela quando uma hemorragia incontrolável queria ganhar da gente.

Há o Maschio, o Paulinho, o Wlady e o João. Há muito que não os vejo mas nunca deixei de lhes dedicar meus beijos. Foi com eles que descobri a generosidade do beijo que cumprimenta e abraça, que reduz a pó as diferenças. Pudera ser tão forte para lidar com todos os preconceitos como aprendi com eles a respeitar todas as formas de amor. Quando voltar a encontrá-los, e sei que isso acontecerá, vai ser aquela beijação carinhosa, porque os beijos a gente dedica às pessoas que gosta.

Ora, beijo meu filho Gabriel, um homão maior que eu e já percebi alguns olhares estranhos, na rua. Que se danem os que estranham. Beijo os filhos do Marcos, meus sobrinhos, que são grandes e barbados e não podem deixar de ganhar esse carinho. E não beijo o Rô e o Léo, meus outros sobrinhos, porque sou bobo. Eles entenderiam o cumprimento entre homens.

Homens que merecem o beijo do carinho como o meu irmão Marquim. Coitado, foi escolhido para ser irmão e para ser beijado em público. Ele é uma das pessoas fundamentais da minha vida. Não só porque, juntos, passamos muitas situações difíceis, mas porque sempre é um exemplo lembrado quando acredito que não vou conseguir vencer um desafio. Ele merece muitos beijos, pelas tantas batalhas em que se meteu e, ganhando ou perdendo, sempre saiu vitorioso.

Enfim, com as brincadeiras (e até os preconceitos) da crônica anterior, achava que devia esse beijo escrito aos homens. Se tenho os filhos que tenho é porque, um dia, aprendi a beijar e a ser beijado, de homem para homem, como o menino que confia e o adulto que nunca trairá essa confiança.

 
 
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