MATINÊ
Luiz Fernando Kiehl
 
 
Meu cliente ia demorar e resolvi fazer hora num cinema de bairro. Entrei sem me preocupar em saber o que estavam passando. A sessão já havia começado. Era um filme antigo em preto-e-branco e a sala estava muito escura. Escolhi uma poltrona na última fila, perto da entrada.

Quando os meus olhos começaram a se acostumar, percebi que o cinema estava quase vazio. Havia apenas umas vinte pessoas solitárias espalhadas pela sala. Desconfiei que era um filme de amor pois, na tela, um casal se beijava em close.

Um cheiro de inseticida, típico de pulgueiros como aquele, impregnava o ambiente. O lanterninha indicou um lugar para outro retardatário. Estava cansado da luta diária e meus olhos teimavam em se fechar.

Quando os abri novamente, Lucila sorria para mim na poltrona à minha direita. Não a vira chegar, talvez tivesse cochilado um pouco.

Lentamente, para não assustá-la, apoiei um braço nas costas da poltrona da minha primeira namorada. Depois deixei a mão encostar no seu ombro, fazendo um suave carinho. Lucila fingia prestar atenção ao filme, mas eu quase podia ouvir as batidas aceleradas do seu coração. O perfume da adolescente também me encorajava mas, mesmo assim, eu hesitava. Como é difícil o primeiro beijo!

O estampido de um tiro na tela fez com que Lucila se esvanecesse, desaparecendo tão repentinamente como surgira.

Confuso, acendi o isqueiro para olhar o relógio: três e quinze. Meu cliente já devia ter voltado do almoço. Levantei-me e saí, com os olhos agredidos pela luz da tarde. Na calçada, antes de atravessar a rua, acendi um cigarro e pensei:

- Eu devia ter beijado...

 
 
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