OLHOS
VERDES
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Marta
Rolim
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No
sítio de Dona Odete, a vaca, as galinhas, o galo, o boi e o cavalo, exibiam
radiantes olhos verdes. Era marca de propridade, registrada. Na terra verde
do Vale Verde, os animais todos tinham olhos verdes. Mas só naquele reino
encantado de um acre, porque no restante do município, os bichos assumiam
suas cores de sempre: pupilas pardas ou escuras, exceto por um olho mais
esfuziante de galinha ruiva.
Pois Dona Odete andava ostentando demais o rebanho raro que tinha e não perdia ocasião de promover seus animais e as parelhas de boi, inigualáveis, de olhos verdes combinantes, e até os porquinhos tenros, de pele rosada e bolitas esmeralda, ela tratava de exibir na cerca, com laço de fita. E que ninguém pensasse que ocorria só um tom de verde na fazendinha. Não, nada disso, vingava olho verde-musgo, verde-maravilha, olho verde-piscina, verde-mar, verde-limão. Um festival de verde nas pupilas da bicharada, pra ninguém botar defeito. O curioso é que o bichano que nascia na terra da vaidosa senhora, já nascia com o "dom ocular" e por mais que os curiosos examinassem as vistas coloridas e dessem para pesquisar os mistérios das ciências (uma tal de intrincada o-f-t-a-l-m-o-l-o-g-i-a, cruzes, Nosso 'Padinho' Cícero!) nada descobriam. Seu Robertinho fez até uma experiência que ficou famosa. Ofertou dois cordeiros recém desmamados para dona Odete, de presente. Os dois rebentos lindos e saudáveis como só eles, de meigos olhos... castanhos, bem castanhos! E não é que mal os bichinhos haviam cruzado a porteira de dona Odete e já exibiam, cada qual, um par de vivos olhos verde-grama! Os filhotes, de um instante para o outro, ainda mais graciosos, saltitantes pelo campo, com a lã branquinha contrastando com o verde escuro dos olhos. Como é que sucedia a transformação, não houve quem explicasse. O fato é que não havia bicho no sítio Vale Verde, de propriedade da boa Odete, que ficasse sem a íris raiada de um belíssimo verde, sendo que a própria gloriosa senhora, mirava o mundo com grandes olhos tom de espinafre. Algum truque a danada tinha, mas já havia quem a tivesse por bruxa ou feiticeira. Pois que fosse! Para ela pouco importava. Não vendia nenhuma das crias por nada. Ficou rica com os visitantes, que vinham de longe e pagavam sem reclamar, tudo para ver as galinhas, os sábias, os cordeiros e cavalos, os porcos e cachorros; os gatos e coelhos, todos, com lindos olhos coloridos. As vezes ela dizia, muito bem humorada, fazendo rima e poesia, que o vizinho se olhasse no espelho, pois o milagre se multiplicara. E qual não era o encanto, quando o mais descrente, deparava com seu par de olhos de um verde reluzente. Já se olhou no espelho hoje? - perguntava divertida, e ai de quem duvidasse, pois era o escolhido e à vista de todos, tinha os olhos remexidos: do castanho para o verde; do azul para o esmeralda; do preto para o espinafre, num instante, sem disparate. Já se olhou no espelho hoje? |