MICHELLE
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Fernando
Zocca
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Rodeado
por bens que a muitos faltavam, possuindo mais do que o necessário para
manter sua própria vida, via-se em abundância rara que chegava até a assustar
pela exuberância e onipotência.
Super alimentado e carente por distração, com roupas novas e lindos carros, punha-se a buscar carinho que não tinha. O tédio que da alma lhe tomava o poder era indestrutível até mesmo em seu labor diário na repartição autárquica estadual. A rotina de anos e anos a fio, seria quebrada naquela semana pelo ingresso em seu lar de uma nova e supereficiente empregada doméstica. Seus olhos verdes foram determinantes na escolha dentre as centenas de alternativas que se lhe apresentavam naqueles dias inesquecíveis. Morena jambo já comprometida pelo casamento tinha ela filha e muito endividamento financeiro a cumprir. Esperta no desempenho das tarefas chamava a atenção pela eficiência e rapidez com que compunha o trabalho diário. Sua família de orientação composta por pai, mãe e quase uma dezena de irmãos encontrava-se em dificuldades para achar um local onde pudessem residir sem a opressão de um aluguel explorador. O patriarca já velho e arqueado pelos anos de existência suplicava aos céus um cantinho onde pudesse, afastado do burburinho das crianças, elevar a Deus suas preces de louvor. Esperança viva se apoderou de seu ser e seus olhos expressaram a alegria quando sua filha noticiou a contratação de seus serviços no lar do abastado. O novo trabalho serviria à moça bonita, morena esperta como lenitivo e distração aos sofrimentos que lhe proporcionava um marido ébrio e violento. A separação dera-se por agressões e incompatibilidades geradas pela discórdia e vício. Os meses passaram-se céleres e no ramerrão diário dos serviços domésticos a intimidade com o patrão praticamente solitário proporcionava ao grã-fino a alegria de ver aquela beleza toda exuberante a sua disposição em sua casa enorme e povoada somente por mobiliário clássico. Procurava o bacana sair mais cedo de seu trabalho para ainda no meio da tarde poder observar a formosura da morena bela desempenhando seu labor profícuo. A mulher apesar da pouca idade claro notava o interesse vivo do galã, por suas curvas belas e massa corpórea reluzente. Sentia-se meio que constrangida pelos olhares de luxúria que lhe percorriam o corpo na luminosidade primaveril. Apesar de também se excitar naquelas situações, ela sabia que não poderia deixar-se levar pelas emoções lascivas. Mas para o galanteador solitário aqueles olhos verdes eram irresistíveis e por pouca moral segurava-se ainda sem que a abordasse com convites secretos. Ela sabia de antemão que as barreiras que por ventura ainda os mantinha separados cairiam em qualquer ocasião propiciativa. Por isso planejou e anteviu todas as alternativas resultantes da aproximação. Sua mãe fora alertada sobre o interesse do varão. Seu pai velho e desdentado foi cientificado que havia veemência carnal do patrão e que a abordagem se daria em pouco tempo. Na iminência do contato físico a morena expôs ao namorador a necessidade dos pais por uma moradia. O antigo e fiel funcionário tinha imóveis às dezenas nos bairros distantes da cidade. E não haveria problema algum em colocar a família da moça num prédio desocupado. Mas para isso ela deveria ser-lhe dócil e deixa-lo provar do seu amor. Ele agiria diferentemente da forma com que agiu com a funcionária anterior. Ficara refém da sua família ao bolinar a adolescente que viera pagar o aluguel. E por isso, nada mais que isso, ficou sem ver a cor do dinheiro fruto dos alugueres por mais de trinta meses. Sua estultícia prendeu-o pela vergonha. Agora a história seria diferente. O contrato e o consenso eram as melhores formas de se obter tudo. Inclusive o amor. E foi assim que se esquecendo completamente das armadilhas anteriores locou por preço justo a casinha bonitinha para os familiares daquela que viria a ser seu verdadeiro amor. Naquelas semanas as flores amarelas tinham um realce especial no fundo azul do céu primaveril. |