TENTATIVA E DESISTÊNCIA
Roseli Pereira
 
 
Abro uma página virtual e fico lá, com os meus dez dedinhos apontados para o teclado. E nada.

Pedra falsa, pedra falsa, pedra falsa.

Há dias estamos nos encarando assim, a folha virtual e eu. E, há dias, ela continua branquinha e limpinha. Assim como a minha central produtora de idéias.

Não que eu não seja capaz de ter idéias sobre uma simples pedra falsa. Mas, há dias, nada do que eu penso leva jeito de que vá render uma crônica decente. Ou pelo menos quase.

Pedra falsa, pedra falsa, pedra falsa.

Pois saiba que, com ou sem idéia, eu vou começar agora. Pelo simples fato de ter assumido comigo mesma o compromisso de escrever semanalmente sobre um tema que me fosse determinado. E de estar disposta a honrar esse compromisso, ainda que eu tenha que me transformar pessoalmente num texto (quase) decente sobre uma tal de pedra falsa.

E é bom que você saiba disso já, porque como não tenho a menor noção do que vai ser deste texto daqui pra baixo, se você decidir continuar a leitura, que seja por conta própria e auto-risco. Parafraseando a Clarice Lispector.

Pedra falsa, pedra falsa, pedra falsa.

E aí eu me pergunto (pela enésima vez): o que é, afinal, uma pedra falsa? E aí eu me respondo (pela enésima vez): pedra falsa só pode ser qualquer coisa que se parece muito com uma pedra, mas não é. Que tenha cara de pedra, textura de pedra, cor de pedra e, se bobear, que tenha até cheiro de pedra. Mas não é. Que nem pedra cenográfica, por exemplo. Você olha de todos os lados e jura que é uma pedra. Aí você bota a mão e percebe que é papel. Ou madeira. Ou isopor. Mais falsa que isso, impossível. Principalmente em se tratando de pedra.

Por outro lado, uma pedra de cor verde-esmeralda que não seja uma esmeralda pode até não ser preciosa, mas continua sendo pedra. A não ser, é claro, que seja sintética. Porque pedra sintética pode ser tudo, menos pedra.

Em outras palavras: a tal da pedra pode até ser uma esmeralda falsa. Mas se for uma pedra, é pedra verdadeira. E isso vale pra qualquer outro tipo de pedra em que você possa pensar.

Pedra falsa, pedra falsa, pedra falsa.

Ah, é! Tem também uma história interessante, que eu ouvi uma vez lá em Piracicaba. Me disseram (e eu já nem me lembro quem foi) que uma cidade vizinha, Rio das Pedras, tem esse nome por adaptação ou por puro esquecimento. É que, bem lá nos antigamentes, aquele lugar teria sido uma grande fazenda, cujo dono teria tido três filhas que se chamavam Pedra (note que esse Pedra não é pédra: é pêdra, a versão feminina de Pedro).

Uma talvez fosse Pedra Maria ou Maria Pedra, outra talvez fosse Ana Pedra ou Pedra Catarina e a terceira, quem sabe, seria Joaquina Pedra ou Pedra Augustina. Mas isso é mera divagação e não tem nada a ver com o assunto.

O caso é que as três adoravam nadar no rio que passava pela fazenda e que, por isso mesmo, ficou conhecido como rio das Pedras (pêdras, por favor. Não se esqueça de botar o acento das moças no lugar certo). E aí o tempo foi passando, passando, até que o nome caiu em desuso e as Pedras caíram no esquecimento. E e o rio virou rio das pedras. E veio a cidade que levou o nome do rio.

Pode até ser que a ordem dos fatores não tenha sido bem essa, mas o fato é que se a história é verdadeira, a pedra do rio é falsa.

Pedra falsa, pedra falsa, pedra falsa.

Mas o que é que eu vou escrever sobre pedra falsa se, até em termos de adorno, pra mim as pedras valem muito mais pelo brilho e pela cor do que pela preciosidade? E por falar nisso, será que todo aquele brilho dos meus acessórios de strass não passa de brilho falso?

Aliás, você já notou como um bom strass brilha muito mais do que um mau brilhante? Ou mesmo do que um bom brilhante sujo? Pois é. E aí eu fico pensando: se o que as pessoas querem é brilho, por que será que a grande maioria acaba preferindo se enfeitar com um brilhantezinho de nada, se, por um preço infinitamente menor, é possível cobrir o corpo inteirinho de strass? E sem stress, diga-se de passagem. Será que eu sou meio maluca ou estou vendo mesmo um contrasenso?

Bem, pelo menos agora vocês já sabem que, se me encontrarem brilhando por aí, será por conta de maravilhosas bijouterias bem baratinhas. Que nem sequer procuram imitar as jóias, porque eu não tenho gosto e nem dinheiro pra isso (ou será que é ao contrário?).

Pedra falsa, pedra falsa, pedra falsa.

Quer saber de uma coisa? Cansei. Além do mais, vai ficar muito mais bonito se eu parar logo com isso e confessar, de uma vez, que não estou conseguindo escrever nada que preste sobre pedra falsa. E é bom que eu faça isso antes que alguém imagine que a minha cabeça é que é dura que nem uma pedra. E que, por não ser uma pedra, seja totalmente falsa.

 
 
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