JÓIA
Maurício Cintrão
 
 
Que ele tocasse seu corpo como se fosse bijuteria, é compreensível. É de brinquedos, imagens e idéias que se faz o amor. Tenho amigas que se sentiriam lisonjeadas com esses torneios de fantasia. Dependendo do toque, quem não gostaria de ser um anel ou um brinco do parceiro?

Imagine-se dançando por entre os dedos dele e, depois, dependurada nas orelhas, como se fosse uma menininha no balanço dos desejos. Olhe só que gracinha, os pés chutando o ar, os cabelos esvoaçando. A mulher-brinco ganha vida nas brincadeiras brilhantes.

O que não dá para aceitar é aquele olhar desconfiado. Ele mudou muito e enxerga pedras falsas nos seus olhos. Isso não se pode aceitar. Quem tem olhar de pedra, tem olhar frio, e isso você não tem. É só olhar no espelho. É só olhar você.

Tudo bem, ele não precisaria enxergá-la como a uma jóia. Há homens que não entendem dessas coisas. Mas poderia tratá-la como tal. E isso nada tem a ver com o fato de seus cabelos estarem prateando. É verdade que esse brilho empresta um charme especial à sua beleza.

A grande questão é que ele não enxerga seus diamantes e ouros. O azedume do tempo interrompeu a capacidade exploradora que ele tinha. Já não consegue mais prospectar suas fendas e cavernas à procura de novas jazidas. Para ele, você perdeu valor.

Para quê desperdiçar suas minas, então? Parceiros que se prezem sempre encontram um jeito para voltar a escavar. O amor é construído nos túneis dos relacionamentos prolongados. Às vezes, vários túneis em um mesmo relacionamento.

Mas para que um tire das terras do outro a preciosidade oculta nas profundezas dos segredos é preciso paciência e companheirismo. Perder a sensibilidade é como ser um garimperio apressado. É ignorar a dinãmica da mina, é impedir o bailado natural das escavações apaixonadas.

Pudera houvesse uma fórmula mágica capaz de despertar no coração alheio o fulgor iridescente das paixões multicoloridas. Com certeza, você tentaria fazer com que ele enxergasse seus olhos de outra forma.

Mas, no fundo, todos sabemos que, do jeito que está, pouco se conseguiria. Nem se houvesse a fórmula, nem se houvesse a forma. Pois brilhamos sugestivamente aos olhos do parceiro que ele aceita o brilho que sugerimos.

O aceitar a sugestão do brilho é que intensifica a luminosidade e a transparência sugeridas. O jogo segue seu curso quando ambos concordam em ceder, recebendo brilhos e belezas quem nem todos conseguem admitir.

Seus olhos não são pedras falsas. Mas traduzem a dureza que está dentro dele. Ao invés de enxergar suas jazidas de gemas e metais preciosos de paixão, ele só consegue ver o cascalho do vaso em que plantou sua descrença.

 
 
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