OS
MÁXIMOS
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Marco
Aurélio Brasil Lima
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Espalharam
cartazes por toda cidade: "OS MÁXIMOS. Grande show de rock'n roll.
No auditório do Grêmio, dia..." Uma foto de uns garotos com roupa de
couro e cabelão.
Tinha um no bar do Cegonha, embaixo do balcão azul de fórmica. - Que raio é esse negócio desses cabeludo aí, Cegonha? perguntou o Flausino, pitando o cigarro de palha. Uns seis minutos depois ele respondeu: - Sssssssssei lá. Umas coisa que vem de São Paulo. Tinha um no salão da Lisângela, atrás do secador. - Cê num acha que esse mundo tá perdido, Zulmira? A Gemima tá querendo ir ver esses esquisito aí. Não tem o que eu fale que faça ela desistir. - É - respondeu a Zulmira. Tinha um no boticário, do lado da propaganda do Emplastro Fortifex. - Castelhando, você já viu homem usando calça de couro? - Onde foi que você viu homem aí, Damastor? Mas no sábado a molecada tava lá. Não tinha adiantado o sermão do padre, condenando as músicas americanas, não tinha adiantado a consternação geral e o abaixo-assinado da Liga das Senhoras Católicas. O mestre de cerimônia (era o Argemiro, caixa da lanchonete do clube) anunciou com entusiasmo (bom, quase com entusiasmo)Os máximos, e então os seis rapazes da capital entraram causando enorme frisson no auditório abarrotado (tá bom, quase abarrotado. Mais ou menos lotado). - Boa noite Jepiroquara! o vocalista gritou no microfone e houve uma ovação generalizada. Isso é rock'n roll! ele gritou e começou o barulho. Eram umas musiquinhas bem feinhas, com uma marcação de baixo simplória, guitarra sofrível, melodia tacanha, e marcação ritmica quase Ray Connif. E o pessoal dançava e pensava: esse tal de rock'n roll é diferente da bossa nova porque não tem violão e porque os caras são meio esquisitos. Demais! E o magricela espinhudo do órgão repetia a melodia que o vocalista cantava e o que ele cantava era uma coisa meio assim: "sem você eu não vivo, iê iê iê" e, Selma, a gordinha filha do fazendeiro Dagoberto gritava dizendo que aquilo era melhor que Beatles, porque ela conhecia Beatles, porque tinha todos os discos. Entre a quarta e a quinta músicas, contudo, um sujeito enorme, de desgrenhados cabelos grisalhos, roupa preta, barba no peito aberto, invadiu o palco. - Olha o gringo! o pessoal gritou. Era o cara estranho que morava na estância que tinha sido do velho Quincas e que nunca falava com ninguém e de quem ninguém sabia patavinas. Os Máximos olharam pra ele apalermados. Quem é esse chapa? - Vão embora - ele disse com sotaque forte ninguém sabia muito bem da onde. Todo mundo vaiou, o vocalista deu uma risadinha e perguntou por que? O gringo chegou no guitarrista, arrancou o instrumento da mão dele e tocou um solo de sete minutos. Ajoelhou, tocou a guitarra nas costas, tocou com os dentes, por entre as pernas, e todo mundo estático e boquiaberto. - Isso rock'n roll. Ele disse quando acabou, todo suado e feliz. O público enojado vaiou, tacou coisas e ele foi embora chateado. Foi uma breve interrupção na turnê gloriosa dos Máximos pelo interior do Paraná. |