FRACTAL
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Sérgio
Galli
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Zâmbia.
Zumbi. Zumbido. Zoeira. Zona. Frank Zappa. Zarpar. Zunir. Zoroastro. Zimbábue.
Zinco. Zen. Zênite. Zás-trás. Cenas se sangue num bar da avenida São João.
Tiroteio no morro do Borel. Bala perdida assassina. Nasceu, no zoológico
municipal, o filhote de ornitorrinco. Descoberta a vacina contra o vírus
da aids. A cura do câncer está próxima. Ministro do Apagão confirma, depois
de longas e tensas negociações, o acordo com São Pedro. As chuvas virão.
Palestino explode lanchonete Macdonalds em Jerusalém. Na Irlanda, protestantes
e católicos rezam a santa guerra e saem no braço, na faca, nas armas. Pagodeiro
atropela, mata e zarpa sem deixar rastros, sem destino. Direto de oliúde:
atriz famosa dá o fora em canastrão. Ministério da Fazenda e a Secretaria
da Receita Federal decretaram que os cidadãos contribuintes irão pagar uma
taxa pelo ar que respiram. A lei entra em vigor na data da publicação da
mesma. Seqüestrado mais um. Baú da infelicidade infelicita. A globalização
navega a todo vapor, de vento em popa.
Zap. Zapear é o verbo neologismo que causa frenesi nos publicitários de plantão. O oráculo dos tempos pós-modernos (pobre tempos pós-modernos), a televisão, entope, entulha, empurra zilhões de informações a cada segundo justamente para deixar todos desinformados. Imbecilizados. Hipnotizados. Emburrecidos. Idiotizados. Apalermados. Afinal, existe tão somente o consumidor que é ininterruptamente induzido a consumir, comprar, consumir compra, consumir, comprar, consumir... inclusive produtos maquiados pelos impolutas e probas empresa multinacionais. Lembrar uma singela ironia: a maioria dos telespectadores bombardeados pela avassaladora publicidade mal tem dinheiro para comer, quanto mais comprar aquele monte de quinquilharias: sabonete, pasta de dente, cerveja vagabunda, automóvel e, amiúde, a sobremesa. Zap. Zoom. A bem da verdade, a televisão é uma falácia. Mentiras ao léu. Virtual. Mundo irrreal, tal qual o os habitantes do Planalto Central (a rima fácil foi sem querer). Desbragadas mentiras não são à toa. Não são inocentes. Não são sem querer. Estão a serviços de múltiplos interesses. Essa tal globalização, por exemplo. Uma tola mistificação. Desde os fenícios já havia troca comercial além-mar. Vieram os gregos, os romanos, o "descobrimento" da América, o caminho para as Índias, a revolução industrial. O que há de novo é a comunicação. Voltamos ao trilho. Mundialização. Apenas 6% da humanidade tem acesso à internet. Só 10% já fez alguma ligação telefônica. Tóquio tem mais telefone que a África toda. Isto quer dizer que só no hemisfério norte e no chamado primeiro mundo (expressão ridícula, típica de povo colonizado). Por falar nele e nela, a globalização, vejamos uma matéria do New York Times republicada no jornal Estado de S. Paulo, de três de setembro. Nela, fala-se sobre, entre outras coisas, escravidão (sim, em pleno século 21, em plena Europa), tráfico de escravas sexuais. Perplexidade? Não! Nas entrelinhas, pode-se achar respingos de verdade, do mundo real que não é aquele do jornal da hora da janta nem da telenovela pós-referido noticiário. Zap. Zarcão. Zarabatana. Perguntar não ofende: qual a diferença entre televisão e cloaca? Excremento ao menos serve para adubar árvores e plantas. Vale citar uma frase do cenógrafo e cineasta russo Dziga Vertov: "quem não tem nada a dizer hipertrofia o cenário". ***** Sugestões: além da leitura na íntegra da referida matéria no Estadão, o romance Bel-Ami, de Guy de Maupassant. Para audição: Ouro Negro, disco do compositor Moacir Santos. |