AS
FORMIGAS QUANDO INTOXICADAS...
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May
Parreira e Ferreira
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Morrem tombadas para o lado direito. A afirmação de um amigo extremamente observador era para ser o início de uma crônica bem humorada, mas diante dos fatos não consigo pensar em nada que seja motivo de riso. Acabo de saber da ação terrorista contra os Estados Unidos. Nada que eu diga já não foi pensado ou expressado, portanto, silêncio o meu. Estou, estamos todos, profundamente tristes. Por mais que se imagine conhecer a espécie humana, e eu supunha conhecer, é sempre um espanto qualquer ato de violência. Aprendi em aulas de Etologia, que formigas e abelhas nascem com o instinto de cooperação, e este não é inato no ser humano. Toda uma vida de educação para sabermos que não devemos derrubar nosso irmãozinho do berço, que não vale quebrar o braço do colega que nos empurra. Aprendemos a lavar as mãos, a cruzar os talheres. Assim vai-se criando a civilização. E de repente, num triz, vemos desabar na nossa frente, o mundo. Não nosso mundinho pessoal, que pode cair com uma reprovação no vestibular, uma separação conjugal, a morte de alguém querido. O mundo real, o mundãodemeudeus, caiu, desabou, implodiu. Onde nos esconderemos, por onde andaremos nos dias futuros. Vejo destroços, cenário de guerra, pessoas sangrando, as que se atiram dos prédios, as que morrem na fumaça. O homem tão pequeno, tão impotente, tão sem saber o que fazer, corre, sofre, chora, se desespera. São proporções gigantescas, me encolho, tenho medo, ouço a notícia envergonhada de sentir medo de pivetes no trânsito de São Paulo. Dias antes havia recebido a notícia da separação de um casal muito querido. Trinta anos de casamento e, para mim, a idéia de que poderia haver vida inteligente e amistosa entre seres razoáveis e maduros. A instituição ruiu, juntamente com minha esperança. Tenho de admitir que muitas vezes as coisas sólidas se revelam firmes como pudim de caramelo. Perguntas sem necessidade de respostas, a realidade é inexorável. Não, não vou deixar-me abalar. Levanto minha cabeça caída em ombros pesados, aperto a mão de meu companheiro, abraço os filhos, escrevo, vivo. Mesmo estando triste, mesmo chorando por todos os desconhecidos, pelos amigos e pelas formigas. Coitadas, que também num zap, caem tombadas para o lado, e ninguém a chorar por elas. |