Quando escrevo, passo a informação do cérebro para a ponta dos dedos que a transmitem em toques semi-indecisos para a tela do computador.

Ah, sim, há muito deixei de escrever no papel. Só uso esse recurso quando estou muito longe de um micro e vem aquela vontade - que mais parece uma necessidade física - de colocar por escrito o que se escreve sozinho em pensamento.

Escrever, descrever o que me acontece, é um hábito de anos, aprendido talvez nas tardes pós leitura de Monteiro Lobato, que mais tarde se transformou em caderno-diário na época da adolescência.

Escrever ficção nunca foi meu forte, mas eventualmente acontece. Entenda-se por ficção tudo aquilo que não é fato verídico, seja conto, seja qualquer outro gênero literário.

Sinto muita inveja de quem tem esse dom, de tirar do nada uma estória fantástica. Eu uso a mim e ao que acontece a minha volta como inspiração. Nada muito criativo.

Se colocasse em palavras porém meus pensamentos mais secretos, meus sonhos e invenções mirabolantes, talvez conseguisse escrever um conto - mas um conto sem pé nem cabeça.

Voltando ao ato em si, esse muito mais interessante do que a explicação dos motivos, escrevendo me sinto quase fora de mim. As frases se formam como que sozinhas, dançando em letras suspensas no ar como em um letreiro dos cinemas de antigamente.

Às vezes releio o que escrevi na última frase e mudo um pouquinho. Às vezes as frases somem e preciso reler tudo pra ver se acho o gancho que continue o tema. Umas poucas vezes apago tudo e desisto. São as vezes em que as uvas, ops, as palavras ficam verdes.

Outras vezes o letreiro vem meio confuso, aos pedaços, exigindo explicação adicional e é aí que me encho de parênteses. Parênteses, aquelas chavinhas, não, aquelas mãozinhas sem dedão que abrigam uma explicação, como que protegendo-as do resto do texto.

De vez em quando eu queria me fechar dentro de parênteses e deixar que o mundo ruísse à minha volta, despencando letra a letra, feito chuva caindo no chão.