DE
AMORES JUNTINHOS
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May
Parreira e Ferreira
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Coisa de vinte anos um amigo trouxe de Ouro Fino, uma muda de trepadeira linda e original. Plantei-a na época seguindo as recomendações, mas ela não se desenvolveu como o esperado, infeliz pelo meu superficial interesse ou arrancada por jardineiro inexperiente. Não dei importância devida pois logo a seguir fui para um apartamento, minha vida confinada nas alturas não deu muito certo e, filha pródiga, voltei à casa. Milnovecentosenoventaesete, início do período das chuvas, e muita água havia corrido por debaixo da minha ponte, remexendo a terra, descubro um brotinho que me pareceu ser da planta que não vingou. Deve ter ficado hibernando no solo. Com cuidado para não ferir as frágeis raízes, transplantei-a sob uma árvore que cresce junto à janela do meu quarto. Meses se passando e o cipó subindo e enfeitando o tronco pelado com folhas delicadas, sem machucá-lo. Família achando que um mato estava invadindo a casa. Insistentes apelos para que eu tirasse aquilo que estava se espalhando por sobre a laje. Logo, logo entrará em casa, eles diziam, vai ver quando der bicho, isso é prato cheio para lagartas! Eu mantive firme a atitude de espera. Respondia que enquanto não nascessem as flores, nada seria tirado. Bati o pé. Novecentosenoventaeoito. Virou ano e as janelas adquiriram um elegante bordado, com sianinhas encaracoladas a dar aspecto de bom acabamento. Domingo de sol, reunidos no almoço ao ar livre, minha mãe chama a atenção de todos apontando os milhares de cachinhos espalhados sobre o manto verde. Que coisa mais linda vai ser isto tudo aberto, ainda bem que você foi teimosa, se dependesse de mim, disse ela arrependida. Mês de maio, próximo à data de meu aniversário, ao abrir a janela, meus olhos puderam contemplar o branco mar de pequeninas flores cheirando a mel e atraindo abelhas, borboletas e pássaros beijadores. Passam-se os dias e as florezinhas se alternam nos cachos, mantendo a florada constante, um verdadeiro alumbramento. E pensar que ficaram tantos anos entre parênteses, quietas, aninhadas. Quando vim para Uberlândia, primeira providência foi fazer um estaleiro de bambu para servir de suporte às mudas que vieram de São Paulo. Elas crescem animadas e felizes, de volta ao solo mineiro. Fosse eu o poeta e faria versos que cantassem o amor que surpreende quando cuidado, o amor que floresce na vigia permanente, o amor que encanta o amador na delicadeza paulatina. Fosse eu o poeta, mas o poeta já escreveu sobre as sortes do amor. Então, me instalo confortavelmente no jardim e fico extasiada apreciando este poema natural do Criador. |
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