Tema 034 - LABIRINTO
Índice de Autores
VOCÊS SÃO NOIVOS... VOCÊS SE ENTENDAM!
Bruno Freitas
Na véspera do casamento, existe uma corrida contra o tempo, além de uma disputa pela paciência dos noivos e sua presença nos eventos sociais, jantares beneficentes, e até almoços elegantes, onde supostamente são apresentados entre si, os padrinhos, os sogros e sogras, avós e avôs, irmãos e irmãs, primos, primas, concunhados, etc e tal. Como que num passe de mágica, os noivos vêem-se presos num labirinto de uma rotina corriqueira e gastronômica, onde suas aparições são disputadas, através de uma agenda lotada, e entupida de compromissos sociais. Mal sobra tempo pra curtir a união, e sossegar-se para a cerimônia, descansar o corpo e refletir sobre as mudanças que se seguirão, e suas conseqüências naturais. Os noivos seguem totalmente despreparados e exaustos para uma cerimônia, pois foram submetidos exaustivamente aos jantares e almoços de noivados, onde eram requisitados pelos padrinhos, pais, mães, irmãos, irmãs, tias e tios, primos, primas, e uma infinidade de parentes, esquecidos pela distância, e que somente aparecem numa hora desta. Todos eles disputando a mesma coisa: um horário na agenda lotada dos noivos.

A tranqüilidade requerida para duas pessoas que se amam, é substituída pelo stress diário de inúmeros compromissos inadiáveis e intransponíveis, que somente servem como desculpas para exercer um pouco de formalidade durante eventos recheados de boas maneiras e normas de ética, segundo livros especializados, colunas sociais, e a moral e os bons costumes que vêm sendo passados através dos séculos, de geração em geração. A presença dos noivos em qualquer evento social é diretamente relacionada, ao valor de mercado do casal, que é devidamente estipulado pela escolha dos padrinhos, e pelo poder de aquisição dos pais, tanto da noiva, quanto do noivo, e a inegável predisposição de ambos pais, em impressionar os convidados deste jogo de interesses, numa disputa por uma melhor posição na escala social. Talvez isto seja apenas uma especulação, e que de fato, os noivos venham a ser apenas, míseros peões neste jogo de xadrez. O rei e a rainha são aqueles que tiverem o maior poder de compra, transformando os noivos numa peça de leilão. Talvez até um número de rifa, um sorteio, um bingo, e até uma chance de participar diretamente da felicidade do casal.

A felicidade que não existe, devido à enorme quantidade de afazeres e responsabilidades adquiridas pelos noivos com o decorrer da proximidade da cerimônia. A entrega dos convites é mais que uma simples entrega, são visitas inadiáveis, estimuladas pela necessidade de aumentar o valor de mercado do casal. Isto é, aumentar o número de convidados, na esperança de conquistar admiração de todos, na qualidade de perpetuar sua felicidade entre todos os convidados. Sem contar com os pequenos afazeres, que atribuirão aos noivos, algumas horas de felicidade, após o término da cerimônia. A confecção do bolo, a escolha do ambiente e sua decoração, a música mecânica, o cartório, o juiz, o padre, as testemunhas, o cartório, o ensaio, o curso de noivos, o cerimonial, e mais um cartório. O momento de felicidade após da cerimônia, é quando tudo acaba, e os noivos vêem-se livres de todo e qualquer compromisso, segundo as normas de ética, a moral, e os bons costumes de toda e qualquer sociedade. Toda essa felicidade possui um valor de mercado elevado, e não sai barato. Serve apenas para movimentar a economia do país, investindo em mão de obra e gerando empregos para todas as áreas comerciais, desde lojas de utensílios domésticos, onde se fixam as famosas listas de casamento, aos prestadores de serviços cerimoniais, sonorizadores e alimentícios, e ainda aos cartórios de primeiro ofício e seus juizes, e os padres, e seus santuários burocráticos do Santo Pontífice.

A lista de presentes é apenas um caso a parte, onde os noivos regozijam-se com os brindes dos estabelecimentos que foram incluídos na rota do casamento. Porém sofrem com as horas perdidas, na escolha dos utensílios inúteis para a sobrevivência matrimonial. Geralmente, os utensílios são selecionados, através de uma base preliminar, que consiste na inclusão de todos e quaisquer equipamentos desnecessários para o casal, e que este, por sua vez, jamais disporia de suas economias, na aquisição do material. Isso tudo é meio complicado, mas funciona da seguinte maneira: "Eu não vou gastar meu dinheiro, numa coisa, que eu sei que no dia a dia, dificilmente irei usar". Possivelmente, são incluídas na lista de presentes, coisas como conjunto de fondue, batedeiras elétricas, centrífugas, processadores, micro-processadores, jogos de talheres, jogos de copos, jogos de louças, cortadores de pizza, quebradores de nozes, moedores de pimenta, enfim, tudo aquilo que pode ser substituído facilmente pela mão de obra, e que ainda pode ser considerado um luxo. Enfim, utensílios dispensáveis para a sobrevivência do dia a dia, e que se não fossem os convidados, o casamento, e a própria malfadada lista de presentes, os próprios noivos jamais comprariam em suas vidas. Devemos até mudar o nome das listas de presentes, para alguma coisa como auxilio casamento, já que é também costume dos noivos, receberem gordos cheques, além de é claro, a rifa da gravata do noivo e a sacolinha nupcial.

Talvez, esta correria desatada, seja o motivo para tantas separações após o casório. Mais ainda pelos comentários de todos os incautos e arautos, que acham o máximo, ousarem brincadeiras com os noivos, na forma de mal-dizerem o casamento, comparando-o com algumas práticas medievais de punição a crimes de traição, assassinato, ou roubo - A forca, ou a guilhotina, e ainda a fogueira. O pior de tudo, é que todos realmente acham o máximo, protagonizar tal brincadeira, como os noivos, que além de tudo, suportam a todo o momento as mesmas piadas infames de mesmo conteúdo. Além dos supostos boatos sem fundamento de que o casamento é na verdade de feto, e não de fato. Pois, dizem as más línguas, que a noiva está casando embuchada, e que durante o curto noivado ela tenha sido engravidada, e que a única razão dela estar usando véu e grinalda, é pelo fato de que sua barriga ainda não apareceu. Sendo estes os verdadeiros motivos da aceleração dos procedimentos matrimoniais do casal.

A véspera do casamento é um exercício para a vida social do casal, e tende a refletir o resto da vida dos noivos, que supostamente estariam ultrapassando uma fase da vida e alcançando uma maturidade suprema. A próxima questão em matéria de cobrança de toda a família é diretamente vinculada aos espermogramas, às contagens de óvulos, e aos exames pré-nupciais impostos ao casal. Um casal saudável não pode ficar mais de um ano sem filhos, os parentes mais próximos exigem netos, sobrinhos, bisnetos, afilhados, ou primos. Ainda não bastassem os conselhos supremos dos mesmos parentes mais próximos e por assim dizer, mais experientes com o matrimônio. Mesmo que fossem bons conselhos ou prudentes observações, mas que, vindos de um enorme contingente de divorciados e desquitados, não poderiam realmente conter uma credibilidade em matéria de experiência. Talvez fossem observações próprias e pessoais, de quem não soube escutar os conselhos na véspera de seu casamento, e que mesmo assim, soube aprender com suas dificuldades e aceitar seus próprios erros. Como diz o velho ditado: "Se conselho fosse bom, não se dava - Vendia!". Mas mesmo assim, os parentes mais próximos insistem em espelhar o casamento alheio com seus conselhos aos noivos, numa atitude completamente oposta e às vezes até controversa, da qual os próprios exibiram quando cônjuges.

Nada disso interfere na relação dos noivos, apenas o stress diário, de uma cobrança superior, da tal maturidade recém adquirida pelo matrimônio. Aquela cobrança de que tudo deve ser planejado com antecedência, e que é necessário uma reflexão eterna em cima de toda e qualquer decisão a ser tomada pelo casal. Mas que tudo isso é invenção, e que a vida realmente não é assim, ela é recheada de imprevistos e casualidades, e quase nunca, as coisas saem como planejadas. Pois, se todos soubéssemos disso tudo, não teríamos tido a presa que tivemos em crescer, casar, multiplicar e sermos independentes. Pra ser independente, é preciso saber improvisar, e que todo e qualquer planejamento, serve apenas como base para uma boa improvisação. A tendência de teorizar os fatos, e produzir uma cartilha matrimonial dos bons conselhos para a felicidade do casamento, não produzem efeitos benéficos nem maléficos a nenhum dos jovens cônjuges. Na verdade, tudo é relativo e depende do referencial. A nova tendência agora é relativizar as coisas, e facilitar assim, o entendimento do casal. Sem conselhos inúteis que jamais serão seguidos, e que se perderam no limbo do país das teorias, nem fórmulas pré-concebidas de um relacionamento duradouro e afetuoso para os cônjuges. "Vocês são noivos... Vocês se entendam!".

Protegido de acordo com a Lei dos Direitos Autorais - Não reproduza o texto acima sem a expressa autorização do autor