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NOIVA LOUCA
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Fernando
Zocca
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Era moça brejeira. Do brejo
mesmo. Morava em um morro que estranhamente denominava colina. Seu maior
sonho era casar-se. Mas não tinha muito com o que entrar na união. Tentara
plantar café, mas suas terras eram muito ruins e não obtinha os recursos
que queria. Tentava plantar cana e pronto, ai sim de vez em quando conseguia
algo por seus esforços laborativos. Seus empregados consideravam-se os
reis da cocada preta. Alimentavam-se com afirmações que visavam
minimizar seus traços negativos. Era considerada atrasada culturalmente
por suas vizinhas. Tinha pais e irmãos muito velhos que se horrorizavam
quando percebiam que algo de novo estava acontecendo nas estrebarias.
Estava ficando histérica. na verdade o que se passava em suas entranhas era um notável furor. Um furor uterino que não tinha como ser equilibrado. Naquela fazenda não existiam homens suficientemente capacitados para suprir suas necessidades. Então a noiva esperava sempre por alguém que viesse de fora. Talvez esse traço da sua personalidade fosse herdado dos índios que viviam antes no local. Esperavam eles por aqueles homens baixinhos, barbudos sujos e com seus paus de fogo enormes que subiam pelo rio em suas canoas frágeis. Traziam também aqueles portugueses machados enormes de ferro fundido, pesados, mas com cabos grandes, grossos e extremamente duros. Ela cria que não tinha pecados. A não ser os que indicava sua grande massa corporal: a gula e a preguiça. Alguém já a alertara para os castigos aos tais desvios: pressão alta, diabetes, infartos ou acidentes vasculares cerebrais. Mas não se importava, seguia ingerindo a comida de tal forma que seu vazio afetivo era suprido pela complementação da sua grandeza estomacal. Aquela noiva extremamente feia e nariguda, ansiosa e faladeira, possuía um riacho que lhe cortava as terras. Ela não admitia obra alguma nas margens do córrego e fazia uma tremenda confusão histérica quando notava que sua desconsiderada vizinha tentava erguer uma fabriqueta de baterias ali adiante. Na verdade aquela eterna noiva, já amarrotada pelos anos percebia que não teria como subir ao altar. Estava só. Seu véu já esgarçado e amarelado indicava atraso na convolação das núpcias. Era uma noiva abandonada, uma noiva esquecida, uma noiva que tinha uma casa grande no alto de um morro feio que chamava de colina. Ela na verdade era uma noiva muito doida, paranóica e hipocondríaca. Por ser louca, muito louca, louca mesmo, quem da terra se atreveria? Era difícil tal mudança em sua sorte. Mas não era impossível. Aliás, quase nada naqueles tempos era impossível. Quem vivesse veria. |
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