Tema 032 - NA CONTRAMÃO
BIOGRAFIA
NA CONTRAMÃO
Bárbara Helena

 

Alfredo

Eu sei que você estava cansado por causa das noites mal-dormidas na sinuca, no carteado e na safadeza que você chama de trabalho noturno.

Sei que seus olhos já não são os mesmos de tanto virar a noite no pôquer do Bar do Amaro, ainda por cima com toda aquela fumaça de cigarro.

O cigarro ainda vai te matar, Alfredo.

Reconheço que você não é mais tão garoto, as rugas e a barriga que você tenta encolher toda vez que eu olho distraída, estão aí e não me deixam mentir. Depois do quadragésimo regime, você desistiu e aceitou que nunca vai largar o chope e os tira-gostos da madrugada.

E tem inveja de mim, que posso olhar meus pés, sem precisar fazer ginástica e contorcionismo.

Deve ser por isto que me mandou os mesmos bombons que odeio.

Com a perna quebrada e sem fazer exercício é que não dá para eu deixar o regime, Alfredo. Mas um braço perfeito é suficiente para te dar a porrada que você merece.

Sei que você não é mais o mesmo.

Nossa cama que o diga. A idade chega para todos.

Sabe quem veio me visitar? O português da padaria, lembra dele? Trouxe umas flores bem bonitas e desejou boa sorte para você.

Você precisa mesmo, não é Alfredo?

O Joça mandou a conta do conserto do carro dele e anexo a esta vai a continha do hospital.

Quando sair da cadeia, coração, estou esperando para acertarmos a conta principal.

Sei que você é maluco, irresponsável, estava cheio de cana e nunca ligou pra sorte do carro e da vida alheia.

Mas podia ter me deixado em casa antes de entrar com tudo na contramão.

 

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