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FESTA DE FIM DE ANO
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Luís
Augusto Marcelino
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Porra, cara! Que horas você vai pra festa?
- Não sei, não. Vou passar em casa, tomar uma ducha, meter uns panos e... só falta arrumar uma carona. O diálogo foi ouvido em alto e bom tom dentro do elevador logo as sete e meia da manhã. Rodriguinho e Marcelo deviam ser os mais entusiasmados para o grande acontecimento do ano. Aliás, do século! A festa da virada prometia ser a mais animada dos últimos tempos, e os dois aguardavam-na havia meses, desde que a Maria Rita começou a organizá-la, em setembro. Ia ter de tudo, fora as surpresas. Por uma graça divina a empresa tinha conseguido um resultado muito melhor do que o do ano anterior, e o próprio manda-chuva da corretora já havia prometido uma festa de arromba. No começo, Rodriguinho ficou meio encafifado ao descobrir que não teria Rock. Mas aos poucos foi entrando no clima e se preparou como muitos para o grande dia. Ao lado do amigo, planejava sair com pelo menos uma das garotas da empresa. Mas sabia que o páreo seria duro, pois elas eram menos de 1/3 do total de funcionários. O alvo era a Sandrinha, de Compras. Mas se não desse, e na medida em que o uísque fosse subindo à cabeça, podia ser qualquer uma. Chegou a sonhar com uma transa muito louca no banheiro do salão. Sandrinha, em seu sonho, estava com um macacão branco colado à pele, ressaltando seu corpo escultural. Depois de sair da pista de dança eles se encontravam no bar e ela, distraidamente, derrubava bebida em seu camisão azulado. Sob o pretexto de limpá-lo, esfregava a pequena mão sobre o seu peito e puxava levemente seus pêlos. Depois o arrastava para a pista de dança, justamente na hora em que tocava uma música romântica. Beijavam-se. A língua de Sandrinha invadia sem permissão a boca ardente de Rodrigo e, ao mesmo tempo, ela enfiava sua perna entre as dele, provocando-lhe um imenso calafrio. Depois saiam de fininho para o pequeno jardim, onde trocavam beijos ardentes. Como o tesão ficasse inteiramente incontrolável, resolviam entrar no banheiro externo, menos freqüentado. Quando enfim ele conseguiu abaixar o zíper do macacão e estava prestes a explodir, acordou. Ao lembrar do sonho, já instalado em seu posto de trabalho, sentiu uma quentura em seu rosto e tratou de ligar logo o computador. Ligou para o Marcelo. - Tem certeza de que ela vai? - É claro! Você precisa vê-la. Tá com um vestidinho... Jonas, o chefe do Marcelo, tinha deixado bem claro que não toleraria qualquer deslize de seus rapazes de Vendas. Já na festa do ano passado teve problemas com o Ricardo, conquistador trintão que se exaltou durante a festa e acabou assediando justamente a mulher de um dos diretores. A mensagem era objetiva: se alguém aprontasse, estaria na rua no dia seguinte. Marcelo sabia que ele não estava brincando, mas mesmo assim ele decidira investir numa das moças do telemarketing, nem que fosse para trocar uns beijinhos. Tinha um trunfo na mão: era filho de um antigo gerente da firma, muito amigo do Jonas. O máximo que poderia acontecer era ser repreendido. Aquelas horas da parte da manhã pareciam infinitas, tão morosas que foram. E, além de tudo, o céu de São Paulo se tornou cinzento e carregado, premeditando um temporal de proporções assustadoras. Eles sabiam que, se chovesse muito, além de se atrasarem para a festança, diminuiria a presença feminina. Marcelo, que nunca foi muito afeito a crenças, chegou a rezar. Arrumou uma carona para as oito, em frente ao "Alfredos" - restaurante popular a duas quadras do edifício onde trabalhava. Discou para o Rodrigo e acertaram os detalhes do encontro. Se realmente chovesse talvez não desse tempo de ir para casa se trocar e chegar a tempo. Ainda bem que o amigo ofereceu sua casa para o banho e a troca de roupas. Foi aí que se tocou que não tinha trazido o traje que havia comprado. E o que é pior: não tinha grana suficiente para comprar um cachorro quente. - Dá para usar seu cartão, brother? - Pô, cara. Você é mesmo folgado! Além de eu emprestar minha casa pra você lavar a bunda quer usar meu cartão? Tá certo, fica me devendo duas. Te espero aqui ao meio-dia. Vê se não atrasa! Fizeram as compras no cartão, e ainda parcelaram em 3 vezes. Rodrigo aproveitou para comprar uma camisa extra. Vai que aquela outra que comprei esteja apertada - profetizou para o amigo. A chuva rolou até as quatro da tarde. A estiagem trouxe de volta a esperança de verem a festa povoada com a maioria das poucas garotas da firma. Seria a chance de o Rodrigo concretizar suas fantasias sexuais com a Sandrinha. Chegaram pontualmente às oito, abrindo a festa. Foram logo se servindo com cerveja. Cada um pegou dois copos. - Daqui a pouco vai ser impossível tomar sequer um gole! - É, mas é melhor a gente ir com calma se não se embebeda antes da hora e não come ninguém. A moçada foi chegando e, somente por volta das 10 e meia é que a pista de dança lotou. Marcelo e Rodrigo ficaram numa mesa próxima ao palco. De lá podiam avistar as mais belas pernas e tetas da empresa, incluindo as da consultora da Auditoria. Uma baixinha morena de tirar o fôlego do mais frio dos homens. Houve um momento em que ela puxou o Diretor de Vendas pelo braço e o arrastou para a pista. O gordinho já tinha tomado umas tantas e caiu na farra. Quando começou a tocar lambada o pobre coitado foi pra cima da tal auditora. Só pararam porque ele não se conteve e deixou uma das mãos escorregar na bundona da moça. Aí ela despistou e foi pro outro lado do salão. Pelo resto da festa ele a ficou procurando. Esqueceu de ir ao jardim. Lá a moça estava no maior dos amassos com um figura pouco conhecido. - Tem mais 10 paus pra dar pro garçom? - perguntou o Marcelo. Ninguém mais tá passando por aqui. Sei que tem uma porrada de uísque. Vi a Maria Rita encomendar. - Qual é, cara? Tudo eu? Olha lá, olha lá! Não falei que aquele tal de Beto era boiola? Rodrigo tentava se divertir mas estava ansioso demais porque a Sandrinha não tinha chegado. Resolveu dar uma volta e deixar o amigo se embebedando por mais um tempo. Tentou disfarçar, mas deu de cara com o chefe. - Rodriguinho, seu porra! Gosto de você pra caralho, moleque! É sério... te considero pra caralho! - Eu sei Serjão, eu sei. Tá gostando da festa? - Porra amigão, isso aqui tá o máximo. Já tomei umas cinco doses. Tem uma gatinha pagando alto pro titio aqui. Olha só! Aquela ali. Tá vendo? Tinha pelo menos umas cinco perto uma da outra. O Serjão apontava mas não dizia uma só característica para o Rodriguinho identificar quem era a maluca. Vai ver todas elas estavam olhando pra ele. Também, pudera! O bicho tava com o nó da gravata quase na altura do umbigo e o zíper aberto. Nunca ninguém tinha visto o Serjão daquele jeito. Aquilo ia dar história, no dia seguinte... Sandrinha chegou acompanhada de uma amiga, que o Rodrigo ainda não conhecia. Foi recepcioná-la. - E aí, Sandrinha? Animada para a festa? - É claro! Tenho que me divertir o bastante para espantar o azar. Mas onde está o Marcelo? Vocês não se desgrudam nunca... - Tá por aí. Quem é a colega? - Ah, desculpe. Esta é a Márcia, da filial de Campinas. Como estava fazendo uns trabalhos por aqui, veio comigo pra se divertir um pouco. Você nos dá licença, Rodrigo? Temos de ir cumprimentar o pessoal. Até mais! Ele se despediu das moças e ficou de olho no traseiro da Sandra, enquanto ela se afastava. Meu Deus, hoje eu vou me dar bem! - pensou. Enquanto isso o Marcelo já tinha se aproximado de uma garota de vestidinho azul, que dançava como uma louca. Chegou com aquele papo de que ela dançava pra cacete e que nunca vira alguém que dominasse tão bem tantos ritmos como ela. Já tinha tentado chegar numas três, mas foi desprezado nas tentativas anteriores. O engraçado é que ele ia descendo o nível na medida em que ia levando um fora. A dançarina não era assim o que ele sonhava, mas àquela altura do campeonato o que importava era não sair da festa com as mãos abanando. Conseguiu dar-lhe um beijinho no rosto. Quando insistiu em se aproximar mais ela se saiu com a desculpa de que era nova na empresa e que não pegava bem ficar com ele ali na festa. Mas se quiser ir ao cinema sábado, deixo o telefone - sugeriu. Cinema não era o forte do Marcelo, mas mesmo assim ficou com o número, que até hoje não se lembra onde enfiou. Soube apenas que a moça era uma tremenda galinha e já tinha dado para metade do escritório. Viu o Rodriguinho se aproximar. - Conseguiu alguma coisa? - Só um número de telefone. E você? - A Sandra chegou. Já, já chego junto. - Xiiii, amigo! Acho melhor você partir para outra. Olha lá os malhos que ela tá dando naquele trainee de merda!! Rodrigo engasgou. Vaca! - pensou. Também não vai acabar com a minha festa. Tomou umas duas doses e misturou com cerveja. Resolvera partir para o ataque antes de a festa terminar. Foi ao banheiro jogar uma água no rosto e ajeitar os cabelos ondulados. Encontrou-se com o Jonas, o chefe do Marcelo. - Boa noite, Jonas! Está gostando da festa? - Di-vi-na, Rô!!! Só que está muito quente. Vamos dar uma arejada lá no jardim? Essa não! - imaginou. O chefe do meu melhor amigo é viado... - Ah... agora não, Jonas. Ganhei uma mina que está me esperando lá fora. - Sei, sei. Então curta bastante. Não é sempre que se tem uma festa dessas, não é mesmo? Saiu em disparada, para não correr nenhum risco. Precisava contar para o amigo. Mas onde havia se metido o Marcelo. Rodou pelo menos uns 10 minutos e aí percebeu um alvoroço numa rodinha que dançava a música da garrafa. Aproximou-se. Ninguém menos do que o Marcelo, camisa aberta, tórax molhado de suor e os quadris muito próximos de uma garrafa de Brahma. Indignou-se. Ele é incapaz de sorrir alto no elevador! - comentou com uma loirinha que estava ao seu lado. Mas o fato é que ele estava lá, rebolando e entornando mais um copo de cerveja. Mas isso não havia de ser nada, perto do que viu em seguida. O Diretor Comercial foi chamado ao palco para dizer algumas palavras e desejar Feliz Natal em nome da empresa. Só que o pobre coitado não conseguia sequer pronunciar o próprio nome. - Obrigado, obrigado. Divirtam-se. Uh, te-rê-rê! Uh, tê-rê-rê! Rodriguinho ficou de queixo caído. O doutor Mendes gritando uh, tê-rê-rê. Então imagine só como não estavam os outros. Parecia que todos estavam se divertindo mais do que ele, que ficou feito um otário esperando a Sandra aparecer para depois ela se entregar para o primeiro que chegou junto. Até o Marcelo, muito mais comportado, estava cantando e dançando. Resolveu então que não ia deixar por menos. Na primeira oportunidade atacaria a garota que lhe aparecesse pela frente. Só que as investidas não davam certo. Aumentou a freqüência e o ritmo dos goles. Foi se embebedando até não poder mais e ter de se debruçar sobre uma das mesas, esperando o mundo parar de girar. Foi quando sentiu uma mão leve tocar em seu ombro. Percebeu também um perfume suave invadir suas narinas e uma voz delicada chamar por seu nome. - Rodriguinho, querido! Era Sandrinha, já desacompanhada e com um sorriso aberto estampado no rosto fino. Tinha a certeza de que ela o procuraria e de que iriam passar uma noite inesquecível. A bebedeira pareceu ser arrastada por um furacão, tamanho foi o ânimo que surgiu dentro de si. - Me empresta o isqueiro? - Mas você não fuma! - respondeu, intrigado. - É para o Ernesto. Ele foi buscar uma bebida para nós. |
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