ERA
UMA VEZ, DUAS, TRÊS...
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Viviane
Alberto
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Dia de sol na floresta. Chapeuzinho Vermelho azulava de tédio, observando os esquilos. Tanto tempo já passara e a rotina sempre igual. Mas, dentro dela, alguma coisa estava diferente e ela sabia que o final da estória teria que mudar. O plano já estava pronto e foi com alívio que ela ouviu sua mãe lhe chamar. - Chapeuzinho! Leve esta cesta de bolo para sua Vovozinha! A mesma ladainha. Será que mamãe não percebia que aquela história de bolo já tinha cansado? E aquele capuz vermelho, ridículo, que não fazia sentido numa mulher daquele tamanho. E com aquela cintura. Mães... Repassou o plano e rumou floresta adentro. A Vovó morava longe e o caminho era deserto, se tudo corresse bem, o Lobo-Mau deveria estar por perto. Ah! O Lobo-Mau! De hoje ele não escapava. Foram anos de espera. Centenas de olhares lascivos e ele nada. Mas hoje ele ia perceber. Parou embaixo de uma árvore e começou a transformação. Dobrou o cós da saia. Isso, três dedos acima do joelho. Ótimo. Abriu o primeiro botão da blusa branca. Abriu mais um. E agora? Um ou dois? Virou pra um lado, pro outro. Colocou a mão no joelho, deu uma abaixadinha. É, era melhor deixar só um aberto. Caso contrário, até os Sete Anões iriam correr atrás dela. Pegou a cesta e voltou para a estrada. Agora era só uma questão de tempo e o Lobo apareceria. Ouviu o farfalhar da folhas e sentiu um calor que subia por suas pernas. Num segundo, o Lobo estava na sua frente. Boquiaberto. Dividido entre os joelhos e o decote. Olhos famintos brilhavam. Os olhos dela. Completamente sem jeito, o Lobo tentou continuar a estória: - Err... Mas quem é essa menininha que vejo pelo caminho?... - Ih, pode parar. Vou te dizer uma coisa, presta atenção porque eu não vou repetir. A estória da menininha acabou. E você vai ter que lidar com isso, por um motivo muito simples. - Já sei - o Lobo tentava descontrair o ambiente - Você vai pra Flórida e eu vou precisar fazer supermercado, acertei? - Não, Lobo bobo. O fato é que eu quero você. - Você me quer? Pra quê??? - Pra que... pra te comer, bobinho... Tremia um pouco, o Lobo. - Olha, vamos fazer assim: pega seu bolo, sua cesta e essas intenções aí e volta pra sua casa... Eu, por minha vez, dou meia volta, como umas pitangas e esqueço tudo isso. Enquanto o Lobo falava, ela ia se aproximando cada vez mais. Quando terminou de pronunciar isso, ela já estava com tudo aquilo abraçado a ele. Ela perguntou: - Pra que esses olhos tão grandes? - Pra ver minha ruína... - Pra que essas mãos tão grandes? - Pra roer as unhas depois... - E essa boca, heim? Pra que essa boca tão grande... Ele não teve chance de responder, colado que estava ao beijo da menina. E foi assim que Lobo e Chapeuzinho deixaram de pertencer ao imaginário infantil. Eram um do outro, isso sim. Foram tardes inteiras, manhãs de sol. Noites em que ele deixou de uivar para a Lua. A Vovó teve que se contentar com o Caçador. Mamãe continua fazendo seus bolos, mas agora ela mesma vai entregá-los. Vai perfumada e atenta, quem sabe outro Lobo, ou mesmo um Alce Encantado está por perto... Só pra constar, é bom que se diga que foram felizes pra sempre, mesmo porque os boatos de que Chapeuzinho andava fazendo suas refeições na casa dos porquinhos eram completamente infundados. E o Lobo provou por a + b que nunca em sua vida chegara perto de cachinhos dourados. E acabou-se a história! Quem nunca foi Lolita na vida pode atirar a primeira pedra. |
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