MOMENTO
DE PRAZER
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Alberto
Carmo
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Levei-a até a cozinha. Estava
fria, gélida, como um metal inerte, quase sem vida. Apalpei suas curvas,
toquei-a. Era um contorno de mulher, moldada por um hábil artesão, com
certeza. Olhei-a contra a luz, percebia suas formas, na cor penumbra.
- É perfeita! - pensei. Minha vontade aumentava, acendi um cigarro.
- Não, agora não. Depois, só depois! - e apaguei no cinzeiro. Lembrei que jamais a tinha visto antes. Por distração, falta de tempo, nunca a notei, e agora me parecia tão essencial. Acabara de me mudar, sozinho, e sempre saía à noite, matando meu desejo como pudesse. Às vezes voltava com um gosto horrível na boca, perambulava pelos bares e nada que encontrasse saciava aquele desejo. Ia dormir louco de vontade. Mas o dinheiro escasso não me permitia querer muito. Entrava em casa, quase vazia na minha pobreza. Adormecia imaginando aquele gosto, aquela cor bronzeada, o calor que me aquecesse as madrugadas. Mas deitava e tentava dormir. Sabia que pela manhã poderia sentir-lhe o aroma macio, que poderia sonhar, a lhe beber insaciável - sonha-se melhor à luz do dia. A noite trazia a realidade, e o desejo incontrolável, como se fora um vício de que jamais me livrarei. Mas a encontrei tão próxima, tão pronta. Vaguei longas milhas a lhe sentir o perfume, e estava ali, jogada, talvez mais carente que eu mesmo. Como um louco a sorrir do nada, carreguei-a até a pia, abri a torneira e molhei-a toda. Molhava minhas mãos e a acariciava, percorrendo-a cada centímetro. Sentia a água a transbordá-la pelo corpo, sedento, entregue às minhas mãos. Não conseguia parar, fugia-me o controle, enlouquecido de desejo. Deitei-a e a segurei com mãos firmes, prendi-a entre os dedos. Parecia que quisesse fugir-me ao toque. Apertei-a ainda mais, abaixei-lhe a alça. Meus olhos a tentavam hipnotizar, mantê-la imóvel. Sabia que não suportaria por muito tempo, mas agora era minha. Logo a senti mais viva, com a pele morna a me tentar as mãos. Acariciei-a ainda mais, percorri-a por inteiro. Senti-a ofegante, terna, domada em minhas mãos. Fechei os olhos, imaginando o prazer que se me anunciava. Seu corpo já secava, notei-lhe o movimento interno, uma força a crescer-lhe interior, como um vulcão a se preparar. Seu hálito já aquecido me tocava o rosto, como um carinho de promessas. Desci mais a mão, senti-me queimar em suas ancas. Queria tocar-lhe mais, eternizar aquele momento. Mas ela já se fervia por dentro, ouvia-lhe o interior pulsar sem controle, a vazá-la para fora, a escorrê-la. Sussurrou-me um gemido crescente, soltei-a e a trouxe até a mesa, fervente em seu gozo de cio guardado. Deitei-a ali mesmo, abri-lhe a boca, como se quisesse saborear-lhe a explosão interior. Não podia mais esperar, derramei-a toda, de uma só vez. Tingi-lhe a saliva quente. Vi-a sorver cada gota, a se desaguar, manchando-se como uma deusa, entregando-se ao ritual milenar. Já não estava sozinha. Transformou-se num líquido denso, de cheiro forte, numa mistura cafuza, pronta a ser bebida até a última gota conquistada. Senti que jamais a deixaria. Ela, ainda molhada, e saciada do meu prazer. - Dona Florinda, o café já está pronto! - gritei orgulhoso. - Faço questã de experimentar o seu café! - disse a velha senhora. - Obrigado pelo pó. Assim que eu arrumar emprego eu lhe pago. - Não carece, também já passei aperto. Afinal somos vizinhos, precisando é só falar. - Deus lhe pague! - respondi já saciado. Havia duas semanas que não tomava um cafezinho passado na hora. - Mas que chaleira bonita o senhor arranjou. - Achei no armário. Os antigos
inquilinos devem ter esquecido na - Bão, já é hora. Boa noite. - Boa noite, e obrigado de novo pelo café. - Custa nada. Já vi que café o senhor faz bem. Dia desses venha tomar um cafezinho lá em casa. A porta se fechou atrás dela. Acendi um cigarro merecido, esperado. Dormi cheio de prazer. Amanhã seria outro dia. Quem sabe a sorte me sorrisse. |
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