BLOCO
DO EU SOZINHA
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Viviane
Alberto
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Terça-feira gorda, de noitinha. Agora, o Carnaval é só um compacto na televisão. Nada de adereços e plumas caindo, só os melhores momentos ocupando a tela. O que muita gente viu ao vivo eu só vejo de relance e atrasado, entre uma passada e outra, da sala para o corredor. Eu passei uma semana pensando numa história carnavalesca pra contar. Nada. Nem uma lembrança, nem uma lantejoula escondida no fundo de uma gaveta pra me trazer uma recordação. Nenhuma fantasia de odalisca, carcomida pelas traças. Eu nunca pulei carnaval na vida, nem em matinê. Estranho isso, porque quando eu falo sobre essa minha virgindade momesca as pessoas ficam atônitas, como se eu dissesse 'sim, eu como lâmpadas'. Tem gente que fica com dó...'ai, coitada! sua mãe não te levava?'. Outros olham com aquela cara de quem pensa 'branquela esnobe'. Posso garantir que não é nada disso. Antes, eu não entendia direito o que era samba. A maior lembrança que eu tinha era de um vizinho que, todo domingo, religiosamente, ligava o som numa altura obscena, colocava as caixas pra fora e ouvia, ininterruptamente, todos os sambas-enredo dos últimos cinco anos. Aquilo não foi um bom começo, vocês têm que concordar... Depois fui desenvolvendo meu próprio senso crítico e separando o joio do trigo. As coisas boas são legais pra se ouvir em casa, sossegada, pé pra cima. Já os sambas-enredo, deixo pra quem gosta da Avenida, do tesão que é estar perto da bateria. Indiscutivelmente é legal, mas não pra mim. Aí, minha amiga Bibí vai me perguntar: mas e as aulas de Axé??? É, Bibí, tem as aulas de axé, funk e todas essas modas pra onde você me arrasta. Aliás, é inegável a má influência que você exerce sobre mim, me obrigando a beber todo aquele vinho, naquelas sextas-feiras sonolentas que dividimos vez ou outra. Isso eu conto direitinho numa próxima crônica. Mas aulas de Axé não contam como Carnaval. Vou para lá única e exclusivamente pelo gasto calórico. Se bem que fico bem animadinha na hora de gastar as calorias... Eu queria ser assim, como dizer, carnavalesca. Esperar ansiosa pela chegada de fevereiro, bordar minha fantasia, sair sambando atrás do caminhão do gás. Ou economizar um ano inteiro pra comprar um abadá e me acabar em Salvador. Não sei, queria ter essa coisa, essa alegria nata de avenida e não esse ar blasé tão fora de moda - e de época. Queria, mas não sou. E acabo sempre assim, cansada do carnaval sem nem mesmo ter feito parte dele. Bocejando de cinco em cinco minutos, com alergia a confete e horror a serpentina. |
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