CHUVA
E PACIÊNCIA
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Felipe
Lenhart
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Hoje chove, e, nestes dias de chuva, até a folha do computador, já com todas estas letras e palavras, duas linhas quase completas, fica xoxa, sem graça. Cai uma garoa triste, penosamente devagar. "Cada pingo d'água deve equivaler a uma estrela que derreteu durante a noite", penso, com um sorriso magro nos lábios, quando olho a peneira lá de cima que nos deságua esta amargura. Neste momento, devido à minha blasfêmia, o aguaceiro aumenta, vem temporal por aí. Lá fora, o céu fica de uma cor pálida, parecendo uma grande, imensa porção de algodão mofado. Olho para os morros e não consigo ver nada. O sombrio nevoeiro me tira a visão dos cumes baixos de Florianópolis. Sinto-me péssimo, achando que nunca mais vou voltar a ver aqueles lugares que, na verdade, nem visitei e nem imagino como são, mas que, daqui da minha casa, faço questão de contemplar todo santo dia. E o vento sul, este inferno metereológico, acossa impunemente a Carvoeira. "Vento encanado mata", dizem os sabidos, nossos avôs e avós. Aqui no bairro, então, meus bons velhinhos, morreremos todos, pois a Carvoeira é um vale, e aqui encana todo e qualquer vento do mundo. Ele grita: arranca venezianas das janelas de prédios, sacode as antenas de TV, arrebenta cordas frouxas nos varais das casas de quintais. É um turbilhão de ar em movimento. Ligo a TV no "Weather Channel", canal que fornece previsões, todas muito suspeitas, sobre o tempo de cada região do Brasil, cidade e quilômetro quadrado. Espero, entorpecido pela calma, a região sul, Santa Catarina, e, finalmente, a Ilha da Magia. Sol forte durante todo dia, uma pancadinha de chuva no final da tarde, quando estiver quase escurecendo. Descubro, mais tarde, que o tal canal é estrangeiro e que seus funcionários nem imaginam onde fica esta obscura ilha no fim-do-mundo da América do Sul. Sem já muita paciência e esperança, volto à janela de meu quarto e observo, torcendo pelo temporal que se aproxima, lá fora. |
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