NÃO
É BUNITO, NÃO
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Maurício
Cintrão
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De todos os códigos, o do silêncio é o mais perverso. Por fatores que muitas vezes fogem à explicação mundana, os grupos silenciam em conjunto, por acordo. Às vezes calam até sem combinação prévia, em uma espécie de improviso coletivo. Há silenciadores escritos, é evidente, definidos em norma consolidada. Mas há silêncios consentidos, quase intuitivos, pressupostos, acertados na hora. Não gosto do silêncio combinado a não ser por espanto, respeito à arte, homenagem ao morto ou tristeza absoluta. O silêncio do Maracanã em 1950 diante do Uruguai de Obdluio Varela, por exemplo. O silêncio de São Paulo na passagem do corpo de Ayrton Senna. O silêncio que antecede a salva de palmas ao final de um espetáculo do Municipal. Mas provoca arrepios o silêncio da omissão. É uma mistura de "não vou me meter nisso" com um "ah, dane-se, não é comigo mesmo". O omisso é cúmplice. Alimenta os nervosismos de estrelas, títeres e imperadores de conveniência. A omissão é feno das bestas de fechadas criminosas do trânsito, das sacanagens do escritório, dos tapas na namorada sem um ai da família a defendê-la. O código do respeito é muito parecido com o código da omissão. Por medo ou excesso de zelo, deixam a quem pode poder mais do que pode. Respeitam o chefe, o dono, o autor e o poderoso. Talvez por isso as contestações sejam cada vez menos freqüentes no dia-a-dia. Escrevo tudo isso para lembrar que, enquanto autores, temos uma certa responsabilidade com o conjunto e não podemos nos fiar apenas nos códigos estabelecidos. Superá-los e, não raras vezes, contrariá-los, é parte do jogo de quem cria, de quem faz o novo. Nesse contexto, o erro deve ser considerado como matéria-prima e não como objeto de censura, como pecado. Nosso glorioso site reproduz a capa do Livro de Crônicas dos Anjos. Não cita o autor da capa e esse foi um erro. Mas um erro menor posto que a página de abertura homenageia o próprio livro e sua capa. Com certeza, o equívoco será corrigido. E a lição fica para todo mundo. Só não posso ficar quieto diante do azedume da reclamação. Justa reclamação que poderia ter contornos de um recado ligeiro. Teria o mesmo efeito. Entretanto, incomodou. Incomodou mais ainda o silêncio de todos. Por isso, me sinto no dever de assumir o erro como sendo meu, também. Pois se acho o site bonito e dele faço uso, seus erros me pertencem. E aproveito para aprender. Talvez um dia eu tenha que reclamar do uso incorreto do meu trabalho. Espero conseguir diferenciar, então, o equívoco do assalto. |
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