DEDO
MINDINHO, CATENGA E LAÇO DE AFETO
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Rosi
Luna
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Me lembro tanto daquela bruxa da estorinha de João e Maria que para saber se a criança estava no ponto a malvada pedia para mostrar se o dedo mindinho tinha engordado. Na tentiva de ludibriar a velha bruxa que pouco enxergava eles mostravam um ossinho. Até que um dia perderam o osso e tiveram que mostrar o dedo mindinho. Ainda bem que existe final feliz. A bruxa foi empurrada para dentro e o dedo mindinho ficou lá, pronto para mergulhar nas guloseimas da casinha de doces. Lembrei disso porque nas minhas idas de férias para o Nordeste meu avô sempre pedia para mostrar o meu dedo de catenga. Catenga no Nordeste quer dizer lagartixa. Meu dedo era tão pequeno e tão branco que realmente era a cara de uma lagartixa. Não sei qual era a graça que ele achava, mas sempre que chegava perto dele lá vinha o pedido pra ver meu dedo catenga balançando. O meu dedo mindinho é meio anãozinho, e mesmo sendo uma pessoa adulta ele mede exatos quatro centímetros e meio. Quando aprendi piano com sete anos o coitado fez bastante ginástica para alcançar as teclas. Nem depois de tanto alongamento forçado ele cresceu muito. E no curso de datilografia lembro do dia que ele se entalou dentro da máquina de escrever e foi uma luta para tirar ele de lá do meio das teclas. No ballet ele também foi muito útil e inclinava bastante dando uma graciosidade aos movimentos. Foi graças a ele que consegui uma bolsa para ser monitora na universidade. Não posso esquecer a cara de espanto do menino, que foi o primeiro a entregar a prova, quando a pessoa que fez a avaliação disse que eu havia sido a escolhida. O teste era datilografar uma carta, nós eramos cinco candidatos. Vi todo mundo datilografando numa fúria desesperadora para terminar logo. Fui fazendo a carta bem devagar e datilografando com os todos os dedos. A mulher passou do meu lado e viu o meu pobre mindinho lá se esforçando para não entalar no meio das teclas. Quando ela chamou meu nome completo, pensei que seria para me dispensar. Mas para minha surpresa havia ganho a bolsa. O meu colega protestou. - Mas como pode ser a escolhida? Ela foi a última a entregar a carta. A avaliadora sorriu e disse. - Não falei que era um teste para ver quem terminava mais rápido, a carta dela estava perfeita sem erros de datilografia e ela usa todos os dedos na máquina até o mindinho. Neste dia meu dedo provou que tamanho não é documento e nem sempre quem chega na frente é o vencedor. Surpresas de dedo mindinho chegam a qualquer momento. Outro dia vi alguém que quebrou o dedo mindinho. Achei tão inusitado quanto cair uma jaca na cabeça. Sabe que o mindinho deve ter gostado da situação; ele cresceu em atenção. Só ouvi os comentários do tipo: como pode quebrar um mindinho. Cá pra nós surgiu até um boato de que o dedo mindinho pegou uma briga com outra pessoa e disputou uma "quebra de dedos". Dá pra imaginar que ele ficou em desvantagem. Surgiram conversas também de que foi tentando enfiar a mão no bolso. Nem procurei saber, porque não tem coisa mais chata do que explicar o inexplicável. Pois é sabido que o coitado fêz uma manobra radical para quebrar assim. O fato é que o mindinho é um dedo pra enlaçar e fazer as pazes. É um dedo de laço de afeto. Quando encontrar um dedo mindinho vou enroscar até a pessoa falar que estamos de bem. |
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