DO
VENDEMIÁRIO AO FRUTIDOR
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Viviane
Alberto
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Todo ano ela faz tudo sempre igual... Antes fosse o Chico Buarque cantando. Nem energia tinha, nesse segundo dia do ano. Mas tinha um sol forte, amarelão. Entrando todo pela porta de vidro e não me deixando desculpa alguma pra não dar uma ajeitada na minha mesa. Lixo, lixo, lixo. Não entendo como consigo acumular tanto papelzinho, post-it, rascunho. Aliás, meus rascunhos de beira de telefone são um caso a parte! Se Mãe Dinah analisasse os meus afrescos, com certeza encontraria as previsões corretas acerca do Futuro em minhas intrincadas ilustrações. Só vendo. Foram pro lixo, claro. Trocar de agenda. Olhando pra ela, gorda, toda recheada, me deu um aperto bobo no peito. Ela sabia de tudo. E tinha provas. Lembretes. Frases em código. Canhotos. Horários assinalados. Obviamente, já passei da fase de guardar palitos de sorvete e papéis de bombom. Mas faço coisa pior. Observando a agenda do ano passado, percebi que Diário de gente pretensamente grande não tem flores e bichinhos desenhados, mas fica ali, exposto, logo nas primeiras páginas. No calendário. Bolinhas. Coloridas, marcando os dias. Parecia um daqueles cartões antigos de loteria, aqueles furados. Mas eram só bolinhas. E olhando pra elas, pras datas que elas marcavam, eu fui me lembrando de tudo, de cada dia. E por que ele estava ali, vestido de bolinha. Agora de sabão, porque já tinha ido pro espaço, perdido no tempo. Bolinhas públicas e bolinhas particulares, organizadas em vermelho e azul. As do município eram escarlates, as minhas, celestes. Tem mais vermelho do que azul... Se o ano tem 365 dias, quer dizer que eu trabalhei mais do que vivi a minha vida. Preocupante. Guardei a agenda antiga na gaveta. Quando a gente não tem muita certeza do Futuro, melhor deixar um passado gostosinho ali, à mão, pra adoçar dias amargos. Abri a agenda nova. Códigos telefônicos, capitais. Fiquei sabendo que dia 1º de agosto é Dia do Selo. Posso ver os selos comemorando. Curiosidades: na Revolução Francesa, foi adotado um calendário próprio, 12 meses de 30 dias e 5 ou 6 dias intercalares para as festas republicanas. Estaríamos em Vendemiário, se aqui fosse a França pós 1789. Boa idéia a deles. Deveríamos inventar sempre novos calendários. Já pensou, um para cada nova moeda brasileira? Acho que bebi demais ontem. Virei a página e 2001 me encarou todo branco, em doze quadradinhos, limpos, sem bolinhas. O calendário me perguntou: Vamos? E eu fui. OBS: A quem interessar possa, os meses do calendário da Revolução eram: Vendemiário, Brumário, Frimário, Nivoso, Pluvioso (aposto que chovia nesse!), Ventoso, Germinal, Floreal, Prarial, Messidor, Temidor e Frutidor. |
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