Tema 004 - O PÚCARO BÚLGARO
BIOGRAFIA
LAMENTO
Beto Muniz

Ah, se todas fossem Carol!

Como seria o mundo se todas as mulheres se chamassem Carol? Começaria por não haver mais listas e dúvidas com nomes ocupando o tempo de espera da grávida. Dois ou três nomes em votação seria considerado um tipo de subversão das futuras mães. Carol e pronto!

Depois de alguns anos, nas pracinhas, todas meninas sentadas na areia usariam 'Maria Chiquinha' amarrando as pontas dos cabelos repartidos ao meio, e provavelmente não teríamos no mundo sorrisos pequenos e magros, pois é claro que toda Carol sorri grande e gordo como se meio sorriso causasse dor na alma de alguém. Se todas meninas se chamassem Carol, teriam, todas elas, cara de primeira namorada e a vida seria recheada de primeiro beijo. Seriam todas loiras com cabelos cacheados e também teriam olhos azuis. Todas seriam eternizadas com quinze ou dezoito anos e assim permaneceriam Carol, cheias de sonhos, mas sonhos de menina. Ninguém ousaria, mas se alguém olhasse de frente para uma Carol, sentiria o coração a galope e uma necessidade física de fuga, ou de abraço, pois todas teriam o poder de causar aquele momento de confusão mental seguido pela falta de palavras. Toda Carol teria o poder de encantar... Pensando bem, é melhor mesmo que existam meninas com o nome de Cris.

As Cris são meninas de riso tímido. Um meio sorriso que não se abre mostrando os dentes por inteiro. Quem as vê sorrindo assim pensa que serão eternamente inofensivas. Principalmente porque são vistas em família, sempre próximas da mãe, como que atadas pelo calor materno. Já pequenas gostam de calor, são meninas de cabelos castanhos e lisos. E gostam de músicas. Elas são todas obsessivas, compulsivas por cd's. Sim, gastam o mesmo tempo que as de nome Carol nas livrarias (toda Carol gosta de ler e morre de amor por algum escritor), ou talvez mais, em lojas de cd's. Amam The Smiths, The Cure, Loyd Colle, Natalie Marchant, Elvis Costello e conservam a nostalgia de quando eles tocavam insistentemente nas rádios. Mas o melhor nas meninas de nome Cris é que elas não se eternizam moças. Na medida em que crescem despertam em nós, homens, desejos quentes. Emitem paixão nos olhos e quando nos permitem uma aproximação, seus lábios sugam nossas almas. São fêmeas em constante mutação. Seus mistérios e criatividade nos encantam... Cada beijo é diferente, cada qual mais fatal. Estão sempre brincando com fogo. Se você tiver a sorte de encontrar uma garota que se chame Cris, se entregue por inteiro, porque o amor dela é duradouro. Quase eterno.

Nesse mundo hipotético, a semelhança entre as meninas de nome Carol e as de nome Cris, é que ambas encantam na primeira sílaba trocada. Porém, imagino diferenças básicas entre elas. Podemos falar, por exemplo, da montagem da árvore de natal: quando a Cris pensa em montar a árvore de natal, a Carol (Ah, Carol!) já montou sua árvore de natal há quinze dias pelo menos. A Cris coloca um enfeite velho e desbotado "Ano que vem compro mais enfeites" - pensa ela, mas não compra. Ela conserva com carinho todos objetos e momentos, por isso o amor da Cris é duradouro, quase eterno. A Carol montando sua árvore não é muito diferente, mas os pensamentos são! Porque enquanto a Cris pensa em comprar enfeites, a Carol já comprou... Os enfeites dela são novinhos, lindinhos, brilhantes. Sempre com a cara que acabaram de sair da loja. Cris coloca dois, três, quatro enfeites e percebe que a árvore não está bem montada. Troca todos. A Carol não! A Carol deve colocá-los de primeira, tudo harmonioso. Sim, porque ela não sofre como a Cris com a posição dos enfeites na árvore de Natal. A Carol sabe colocá-los sem se sentir ansiosa com pequenos detalhes. Ela se encanta com o brilho, com as cores e com a sensação de natal pronto para a chegada do Papai Noel. Já para a Cris, cada detalhe é uma história. Cada objeto uma lembrança e cada lembrança uma divagação. Posso assegurar que a Cris conta belas histórias sobre os natais passados. A verdade é que ela tem histórias sobre tudo: príncipes cruéis e princesas aprisionadas em castelos, bruxas feiosas e sapos encantados, lobos famintos e porquinhos espertos... Acredito que ela tenha até uma história de amor envolvendo um Púcaro Búlgaro. Mas a Carol (sim, a Carol!) não contaria histórias. Diria logo o que é um púcaro, mostraria no mapa-múndi onde fica essa tal Bulgária e depois sorriria seu sorriso gordo.

Ah, se todas fossem como a Carol! Mas o que seria de mim se não fossem essas meninas de nome Cris?

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